Principais Aspectos Legais do Dropshipping


O dropshipping é uma forma popular de comércio eletrônico em que um varejista online vende produtos sem precisar manter um estoque físico, terceirizando o armazenamento e enviado diretamente do fornecedor o produto ao cliente.

Neste artigo, discutiremos as principais questões tributárias de civis do dropshipping, as quais devem ser objeto de atenção de empreendedores que pretendem iniciar este tipo de atividade ou que já iniciaram e não deram a devida atenção a tais pontos.

O que é Dropshipping?

Dropshipping é uma prática comercial de varejo online, na qual o comerciante vende produtos de um fabricante ou distribuidor diretamente aos clientes, fazendo tal intermediação.

No Direito brasileiro, pode ser considerado como um ‘contrato atípico'[1], previsto no art. 425, do Código Civil, in verbis:

Art. 425. É lícito às partes estipular contratos atípicos, observadas as normas gerais fixadas neste Código.

Por conseguinte, o dropshipping deve ser analisado pelo Poder Judiciário em analogia aos demais contratos comerciais, considerando sobretudo o art. 4º da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro.

Além disso, a prática comercial também pode ser traduzido como ‘contrato de compra e venda’ (contrato típico), espécie de contrato apontada pelo Código Civil (arts. 481 a 532), ou ainda como ‘colaboração’ ou ‘prestação de serviços'[2].

Em termos jurídicos, o dropshipping envolve contratos de serviço entre o vendedor, o fabricante ou o distribuidor e o cliente final. Tais contratos estabelecem as responsabilidades de cada parte, incluindo prazos de entrega, garantias do produto, políticas de devolução e outras questões relevantes para a transação de venda. Todavia, como é um assunto e uma prática relativamente novos no país, alguns empreendedores ainda possuem dúvidas sobre sua validade e legalidade, conforme adiante exposto.

Dropshipping é ilegal?

Não há nada intrinsecamente ilegal em fazer dropshipping. Além do fato de não haver legislação que proíba a prática[3], a Constituição Federal, em seu art. 1º, inciso IV, estabelece ser um dos fundamentos da República Federativa do Brasil “os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa”.

    • Ou seja, a livre iniciativa, seja ela em forma de comércio físico ou digital, é fundamento basilar da legislação brasileira, pelo que tal prática, por si só, não poderá ser considerada como ilegal nesse contexto.

Todavia, como qualquer outra atividade econômica, há regramentos e normas que devem ser observadas, a fim de não incorrer em condutas irregulares que podem afetar a continuidade do negócio – em formato de  dropshipping -, como por exemplo:

  • Violações de confidencialidade e propriedade intelectual: se um revendedor vender produtos que tenham direitos de propriedade intelectual, como marcas registradas, patentes ou direitos autorais, e não tiver permissão para fazê-lo, isso pode levar a ações judiciais ou até mesmo criminal;
  • Questões fiscais: os revendedores que fazem dropshipping devem seguir as leis tributárias de seu país. Eles podem precisar coletar impostos sobre vendas estaduais ou federais, bem como outros impostos;
  • Regulamentos de Comércio Eletrônico: Algumas jurisdições podem ter leis e regulamentos específicos que governam a venda de produtos on-line. Os revendedores que fazem dropshipping devem estar cientes dessas leis e garantir que estão em conformidade;

Em resumo, o dropshipping é uma prática de comércio digital legal, desde que o revendedor cumpra as leis tributárias e regulamentos de comércio eletrônico relevantes e não viole quaisquer direitos de propriedade intelectual, entre outras disposições. O auxílio de consultoria de advogado especializado, bem como contador de confiança, nesse contexto, é de suma importância para garantir boas e regulares práticas no negócio. Em breve, o assunto será tratado de forma mais específica em artigo jurídico próprio.

Benefícios do Dropshipping

O principal benefício do Dropshipping para o proprietário da loja é a redução de custos. Isso porque a estratégia elimina a necessidade de pagar pelo armazenamento e manuseio de estoque, assim como permite que as empresas de comércio eletrônico vendam uma ampla variedade de produtos sem investir muito em estoque. Não bastasse, também evita a perda do estoque, pela eventual impossibilidade de venda, fato que ocorre por vezes no comércio habitual.

Para evitar tais problemas, o mercado do e-commerce já desenvolveu diversas técnicas no decorrer dos anos, como, por exemplo, as operações “just in time”, em que a produção e distribuição de bens leva em conta a quantidade exata necessária; ou o crossdocking, sistema de distribuição no qual o produto que foi comprado pelo cliente é despachado para um centro de distribuição e logo em seguida já é encaminhado.

Com efeito, o dropshipping além de não ter estoque, também não tem centro de distribuição. Ou seja, a empresa varejista não possui contato com o produto, recebendo apenas o pedido do cliente e encaminhando-o à distribuidora, que envia diretamente o produto. Por conseguinte, a empresa intermediadora obtém lucro com a transação, pois vende o produto por um valor um pouco maior do que o preço pago à distribuidora/fornecedora.

Os fornecedores (distribuidores) também se beneficiam da prática comercial, tendo em vista que podem vender seus produtos diretamente aos clientes, sem a necessidade de administrar uma loja on-line, bem como não precisam investir em marketing de comércio eletrônico, loja online, envio ou gerenciamento de estoque, tendo em vista que os comerciantes do dropshipping se encarregam destas atividades.

No entanto, em se tratando de produtos importados/exportados, o Dropshipping não necessariamente valerá a pen, considerando os altos custos de envio para produtos fora dos Estados Unidos, atrasos no envio e redução da margem de lucro.

Desafios tributários do Dropshipping

Embora o Dropshipping possa reduzir os custos e aumentar a eficiência para os proprietários da loja e fornecedores, existem muitas questões tributárias que devem ser consideradas ao iniciar um negócio de Dropshipping, tendo em vista que impactam diretamente na margem de lucro da companhia.

Impostos de vendas e comércio eletrônico

O imposto sobre as vendas no comércio eletrônico é um desafio importante para os proprietários de lojas online de dropshipping, já que as leis tributárias de ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços) variam de estado para estado.

Além disso, há a incidência de PIS e COFINS sobre o faturamento da loja virtual e, finalmente, imposto de renda da pessoa jurídica (IRPJ) e contribuição social sobre o lucro líquido (CSLL).

Pode haver, não bastasse, a incidência do imposto sobre produtos industrializados (IPI), já que a loja é de propriedade do produtor ou importador das mercadorias comercializadas.

Regime tributário aplicável

Antes do pagamento dos impostos, etapa fundamental é analisar o porte e características da empresa para definição do regime tributário aplicável.

Isso porque as alíquotas de cada imposto variam de acordo com cada regime tributário. No Simples Nacional (faturamento de até R$ 4,8 milhões), por exemplo, a carga tributária pode chegar até 19%, enquanto no lucro presumido (faturamento de até R$ 78 milhões) há uma alíquota pré-fixada pela legislação. No Lucro Real (empresas que faturam acima de R$ 78 milhões por ano), há um cálculo que deve ser feito com base no lucro da empresa.

De todo modo, como dito anteriormente, nesta fase de definição do regime de tributação, é muito importante a atuação de um advogado tributarista especialista, juntamente com a orientação de um contador de confiança.

Responsabilidade Civil no contexto do dropshipping

O dropshipping pode ser definido como “uma relação jurídica contratual classificada como consensual, bilateral, onerosa e comutativa, não solene, principal, de execução continuada e impessoal”[4].

Do ponto de vista do consumidor, o Código de Defesa do Consumidor (CDC) traz normas para a responsabilização de todos os participantes da chamada “cadeia de consumo”, tanto por fatos, como por vícios de produtos e serviços, especialmente no art. 3º, §2º, CDC:

§ 2° Serviço é qualquer atividade fornecida no mercado de consumo, mediante remuneração, inclusive as de natureza bancária, financeira, de crédito e securitária, salvo as decorrentes das relações de caráter trabalhista.

Em regra, esta responsabilização é objetiva, conforme já explicado em artigo anterior sobre responsabilidade civil:

As principais hipóteses acerca da responsabilização objetiva estão previstas no artigo 933 e artigo 927, parágrafo único, do Código Civil, que expressam:
Art. 927. Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo.
Parágrafo único. Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem.
Art. 933. As pessoas indicadas nos incisos I a V do artigo antecedente[10], ainda que não haja culpa de sua parte, responderão pelos atos praticados pelos terceiros ali referidos.
[Grifos acrescidos]

No Código de Defesa do Consumidor (CDC), a responsabilidade objetiva é prevista nos arts. 12 e 14, ipsis litteris:

Art. 12. O fabricante, o produtor, o construtor, nacional ou estrangeiro, e o importador respondem, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos decorrentes de projeto, fabricação, construção, montagem, fórmulas, manipulação, apresentação ou acondicionamento de seus produtos, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua utilização e riscos.

§ 1° O produto é defeituoso quando não oferece a segurança que dele legitimamente se espera, levando-se em consideração as circunstâncias relevantes, entre as quais:

I – sua apresentação;

II – o uso e os riscos que razoavelmente dele se esperam;

III – a época em que foi colocado em circulação.

§ 2º O produto não é considerado defeituoso pelo fato de outro de melhor qualidade ter sido colocado no mercado.
§ 3° O fabricante, o construtor, o produtor ou importador só não será responsabilizado quando provar:
I – que não colocou o produto no mercado;

II – que, embora haja colocado o produto no mercado, o defeito inexiste;

III – a culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro. (…)

Art. 14. O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos.

§ 1° O serviço é defeituoso quando não fornece a segurança que o consumidor dele pode esperar, levando-se em consideração as circunstâncias relevantes, entre as quais:
I – o modo de seu fornecimento;

II – o resultado e os riscos que razoavelmente dele se esperam;

III – a época em que foi fornecido.

§ 2º O serviço não é considerado defeituoso pela adoção de novas técnicas.
§ 3° O fornecedor de serviços só não será responsabilizado quando provar:

I – que, tendo prestado o serviço, o defeito inexiste;

II – a culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro.

§ 4° A responsabilidade pessoal dos profissionais liberais será apurada mediante a verificação de culpa.

Todavia, há autores que consideram que a responsabilização objetiva prevista no CDC não pode ser aplicada no contexto do e-commerce[5], com fulcro na Lei nº. 12.965/14 (Marco Civil da Internet), que é legislação mais específica do que o CDC e não contém previsão de responsabilidade objetiva dos agentes, pelo que deveriam ser responsabilizados subjetivamente.

Todavia, o art. 3º da referida legislação, em seu inciso VI prevê que, em que pese a utilização da internet para o comércio, tal uso deve ser pautado na responsabilização dos agentes de acordo com as suas atividades, conforme se vê:

Art. 3º A disciplina do uso da internet no Brasil tem os seguintes princípios: (…)
VI – responsabilização dos agentes de acordo com suas atividades, nos termos da lei;

Com efeito, é entendimento do Superior Tribunal de Justiça[6] acerca da aplicação do CDC no âmbito do e-commerce, sendo que o comerciante de dropshipping, ainda que ‘intermediador’, provavelmente poderá responder civilmente no contexto de demandas judiciais provenientes de responsabilidade civil de tais vendas.

Conclusão

Em suma, o dropshipping é uma forma popular de comércio eletrônico para pequenas empresas que desejam vender produtos na internet sem investir em estoque físico.

Embora o modelo de negócios pareça simples, existem muitas questões tributárias que os proprietários de lojas devem considerar ao iniciar suas operações de comércio eletrônico.

Também deve ser observada a responsabilidade civil no referido âmbito, não sendo possível, em tais casos, afastar a aplicação da responsabilidade solidária pela reparação de possíveis danos sobre as relações virtuais.

A implementação de estratégias eficazes na constituição da empresa e no gerenciamento tributário, por meio de assessoria jurídica-tributária, bem como contábil qualificadas, podem auxiliar na redução de custos e riscos para o comércio, potencializando a longevidade do negócio.

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AUTORES

Antonio Neiva de Macedo Neto. Advogado (OAB/PR sob nº. 55.082) e sócio do Barioni & Macedo Sociedade de Advogados. Pós-graduado em Direito Processual Civil Contemporâneo pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUC/PR).

Clarice de Camargo Ibañez. Advogada (OAB/PR sob o nº. 110.008). Mestra em Ciência Política pela Universidade Federal do Paraná (UFPR).

Gisele Barioni de Macedo. Advogada (OAB/PR nº. 57.136) e sócia do Barioni & Macedo Sociedade de Advogados. Pós-graduada em Direito e Processo Tributário pela Academia Brasileira de Direito Constitucional (ABDConst). Pós-graduada em Direito Processual Civil Contemporâneo pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUC/PR).

Referências

[1] O Fenômeno Jurídico Do Dropshipping No Direito Brasileiro: Conceito, Enquadramento Legal E Responsabilidade. Disponível em: <https://revista.pgm.fortaleza.ce.gov.br/revista1/article/view/402/332>. Acesso em 16 mar 2023.

[2] A responsabilidade civil consumerista no contrato de dropshipping. 2022. Repositório Institucional do Centro Universitário do Planalto Central Aparecido dos Santos. Disponível em: <https://dspace.uniceplac.edu.br/handle/123456789/2138>. Acesso em 16 mar 2023.

[3] BULOS, Uadi Lammêgo. Curso de Direito Constitucional. 5. ed. São Paulo: Saraiva, 2010. 1653p.

[4] MARTINS, 2019, p. 75-78 apud O Fenômeno Jurídico Do Dropshipping No Direito Brasileiro: Conceito, Enquadramento Legal E Responsabilidade. Disponível em: <https://revista.pgm.fortaleza.ce.gov.br/revista1/article/view/402/332>. Acesso em 16 mar 2023.

[5] TEIXEIRA, TarcisioComércio Eletrônico: conforme o Marco Civil da Internet e a regulamentação do e-commerce no Brasil. 1. ed. São Paulo: Saraiva, 2015. apud O Fenômeno Jurídico Do Dropshipping No Direito Brasileiro: Conceito, Enquadramento Legal E Responsabilidade. Disponível em: <https://revista.pgm.fortaleza.ce.gov.br/revista1/article/view/402/332>. Acesso em 16 mar 2023.

[6] CIVIL E CONSUMIDOR. INTERNET. RELAÇÃO DE CONSUMO. INCIDÊNCIA DO CDC. GRATUIDADE DO SERVIÇO. INDIFERENÇA. PROVEDOR DE PESQUISA VOLTADA AO COMÉRCIO ELETRÔNICO.   INTERMEDIAÇÃO.  AUSÊNCIA.  FORNECEDOR.  NÃO CONFIGURADO. 1.  Ação ajuizada em 17/09/2007. Recurso especial interposto em 28/10/2013 e distribuído a este Gabinete em 26/08/2016.2. A exploração comercial da Internet sujeita as relações de consumo daí advindas à Lei nº 8.078/90.3. O fato de o serviço prestado pelo provedor de serviço de Internet ser gratuito não desvirtua a relação de consumo.4. Existência de múltiplas formas de atuação no comércio eletrônico.5.  O provedor de buscas de produtos que não realiza qualquer intermediação entre consumidor e vendedor não pode ser responsabilizado por qualquer vício da mercadoria ou inadimplemento contratual.
(STJ – REsp n° 1444008 – RS(2014/0064646-0), Relatora: Ministra Nancy Andrighi, Data e Julgamento: 25/10/2016, Terceira Turma, Data da Publicação: 09/11/2016)

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