Estruturação e Reestruturação Societária

estruturação societária

Atualmente, o Brasil conta com mais de 21 milhões de empresas ativas, conforme levantamento do Mapa de Empresas elaborado pelo Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços, publicado em maio de 2023.[1]

Assim, é de se concluir que o tema da estruturação e reestruturação societária é de extrema relevância, pois interfere diretamente na vida da população, movimentando a economia do país e, por consequência, influenciando a rotina dos empresários, gestores e trabalhadores dos mais diversos setores produtivos.

A temática, mais uma vez, demonstra a importância do investimento na advocacia preventiva, com o intuito de manter a saúde dos negócios, mitigar riscos, prevenir litígios e planejar a continuidade ou expansão das atividades comerciais ao longo do tempo.

Como a advocacia pode auxiliar na estruturação societária?

Inicialmente, há que se destacar que os atos e contratos constitutivos de pessoas jurídicas, só podem ser levados a registro quando visados por advogados, sob pena de nulidade, conforme dispõe o Estatuto da Advocacia, demonstrando-se essencial a participação de advogado(a) nas operações de estruturação societária.

Excluem-se desta obrigatoriedade, contudo, as Microempresas e Empresas de Pequeno Porte, nos termos da Lei Complementar nº. 123/2006.

Além do mais, o momento da estruturação de uma sociedade é de extrema relevância e demanda assessoria especializada, pois pode englobar análise de contratos diversos, elaboração de planejamento tributário e trabalhista, implementação da política de compliance, bem como realização de diligências prévias (due dilligence), entre outras providências que se mostrem necessárias diante da análise do caso concreto.

O tema se correlaciona, ainda, com o planejamento patrimonial e sucessório, já tratado em artigo anterior, uma vez que desde a estruturação societária se formarão as bases para que a empresa possa se manter saudável, competitiva e em expansão.

Dentre os documentos mais importantes para estruturação (ou constituição) de uma sociedade, destacam-se o Contrato Social, o Estatuto Social e a Assembleia Geral de Constituição, cada um deles com características peculiares.

  • Contrato Social

Embora não seja condição sine qua non para a existência fática de uma empresa, o Contrato Social é um documento de extrema relevância para as sociedades empresárias cujo capital social é divido em quotas, como no caso das sociedades limitadas, sendo responsável por regularizar sua situação perante os órgãos competentes, possibilitando a abertura de um CNPJ.

Os requisitos principais do Contrato Social estão previstos no art. 997 do Código Civil e compreendem, dentre outros: a qualificação completa dos sócios, a denominação da empresa, o objeto da atividade econômica, a sede da empresa, o volume do capital social e a quota-parte pertencente a cada sócio.

Tão importante quanto a elaboração, é a inscrição do Contrato Social no Registro Civil das Pessoas Jurídicas do local da sede da empresa, no prazo de até 30 (trinta) dias após sua constituição. No Estado do Paraná, tal registro compete à JUCEPAR, a qual dispõe de manuais gratuitos com o passo-a-passo em sua página eletrônica.[2]

  • Estatuto Social

Já o Estatuto Social é o documento essencial para constituição de sociedades cujo capital social está segmentado em ações, tais como nas Sociedades Anônimas, ou, ainda, em outros tipos societários, como as Sociedades Cooperativas e Entidades sem Fins Lucrativos.

Quanto ao conteúdo, assemelha-se ao Contrato Social no que tange à necessidade de apresentar denominação social, local da sede, valor do capital social expresso em reais e objeto social. Contudo, há que se observar, em sendo o caso, o dever de informar o número e valor das ações, conforme suas respectivas classes (ordinárias, preferenciais ou de fruição), além de versar sobre o funcionamento do conselho fiscal, dentre outras exigências previstas na Lei nº. 6.404/1976 e no Código Civil.

  • Assembleia de Constituição

No caso da Sociedade Anônima e da Sociedade em Comandita por Ações constituídas por subscrição pública, outro requisito essencial para estruturação societária é a convocação de Assembleia de Constituição, cuja regulamentação consta dos artigos 86 e 87 da Lei nº. 6.404/1976.

O ato será presidido por um dos fundadores e tem exigência de quórum mínimo para instauração da assembleia, em primeira convocação, com a presença de subscritores que representem ao menos metade do capital social, podendo prosseguir com qualquer número em segunda convocação.

Conforme dispõe a lei (art. 87, §3º, Lei nº. 6.404/1976), observadas as formalidades legais e não havendo oposição de subscritores que representem mais da metade do capital social, o presidente declarará constituída a companhia.

Optando-se, contudo, pela constituição da companhia por subscrição particular, a deliberação poderá ocorrer por assembleia-geral ou por escritura pública, observadas as formalidades legais.

Reestruturação Societária

As reestruturações societárias podem ser definidas como “formas de reorganização das sociedades, que podem unir forças, melhorar sua forma de se relacionar com terceiros e com seus sócios/acionistas ou simplesmente se fortalecer no mercado.”[3].

Em artigo anterior, explicamos sobre a importância de contar com uma assessoria jurídica especializada na hora de proceder com a reestruturação societária, visando prevenir e mitigar os riscos, além de otimizar os ganhos da empresa, permitindo-a passar pelo processo com mais segurança e precisão.

De todo modo, o tema merece ser rememorado, dada sua relevância. Passa-se, assim, à análise dos meios de modificação das estruturas societárias, previstos no art. 1.113 e seguintes do Código Civil e na Lei das Sociedades por Ações.

  • Transformação

A transformação está prevista no art. 220 da Lei nº. 6.404/76 e no art. 1.113 do Código Civil, que dispõem:

Art. 220. A transformação é a operação pela qual a sociedade passa, independentemente de dissolução e liquidação, de um tipo para outro.

Art. 1.113. O ato de transformação independe de dissolução ou liquidação da sociedade, e obedecerá aos preceitos reguladores da constituição e inscrição próprios do tipo em que vai converter-se.

Trata-se de operação visando a modificação estrutural do tipo societário, mas sem dissolução ou liquidação. Por exemplo, no caso de uma sociedade limitada que se transforma em S.A..

Nesse tipo de restruturação societária, mantém-se o CNPJ originalmente constituído, de modo que não ocorre sucessão trabalhista ou societária, mantendo-se nos mesmos moldes as obrigações contraídas anteriormente à transformação[4].

  • Incorporação

A incorporação ocorre quando uma ou várias companhias são absorvidas por outra preexistente. Nesta hipótese, a empresa incorporada deixa de existir, enquanto que a incorporadora passa a arcar com todos os seus direitos e obrigações, ou seja, sucede-lhe tanto nos ativos quanto nos passivos.

Tal modalidade está prevista no art. 227 da Lei de S.A. (Lei 6.404/76) e no art. 1.116 do Código Civil:

Art. 227. A incorporação é a operação pela qual uma ou mais sociedades são absorvidas por outra, que lhes sucede em todos os direitos e obrigações.

Art. 1.116. Na incorporação, uma ou várias sociedades são absorvidas por outra, que lhes sucede em todos os direitos e obrigações, devendo todas aprová-la, na forma estabelecida para os respectivos tipos.

Há exigência de quóruns de aprovação em relação à sociedade a ser incorporada, sendo de metade das ações com direito de voto, no caso das sociedades por ações, e de 75% do capital social em sociedades limitadas.[5]

Poderá ainda, em algumas hipóteses, ser necessária a concordância dos debenturistas para que se efetive a operação de incorporação.

A incorporação, portanto, representa uma “sucessão universal” entre empresas. Ou seja, passa à responsabilidade da incorporadora todo e qualquer direito adquirido e/ou obrigação contraída pela pessoa jurídica incorporada, agora extinta.

  • Fusão

No procedimento de fusão, duas ou mais companhias se unem, dando origem a uma nova sociedade, com nova personalidade jurídica, a qual sucederá as anteriores em todos os direitos e obrigações. Em outras palavras, cria-se uma nova sociedade a partir da junção de duas ou mais, as quais restarão extintas.

A fusão está prevista no art. 228 da Lei nº. Lei 6.404/76 e artigo 1.119 do Código Civil:

Art. 228. A fusão é a operação pela qual se unem duas ou mais sociedades para formar sociedade nova, que lhes sucederá em todos os direitos e obrigações.

Art. 1.119. A fusão determina a extinção das sociedades que se unem, para formar sociedade nova, que a elas sucederá nos direitos e obrigações.

Existem diversos tipos de fusão, a seguir relacionados: a) vertical: quando ocorre a união de empresas que possuem ramos de atuação complementares entre si, mas operam em diferentes níveis dentro da cadeia de suprimentos de uma indústria; b) extensão de produtos: ocorre entre empresas que oferecem serviços ou produtos semelhantes e em operação no mesmo mercado, visando expandir o acesso a mais consumidores; c) horizontal: quando empresas do mesmo setor, concorrentes entre si, decidem se unir numa nova organização, com maior alcance de mercado; d) conglomerado: quando as empresas que se fundem atuam em mercado totalmente distintos, o que representa uma diversificação de riscos e acesso a outras oportunidades de investimento; e e) extensão de mercado: ocorre entre empresas que vendem produtos ou serviços do mesmo tipo, porém atuam em mercados distintos, intentando ampliar a base de clientes. [6]

  • Cisão

Por fim, a cisão está prevista no art. 229, da Lei nº. 6.404/76:

Art. 229. A cisão é a operação pela qual a companhia transfere parcelas do seu patrimônio para uma ou mais sociedades, constituídas para esse fim ou já existentes, extinguindo-se a companhia cindida, se houver versão de todo o seu patrimônio, ou dividindo-se o seu capital, se parcial a versão.

Esta modalidade ocorre quando o capital de uma empresa é transferido, total ou parcialmente, para outra sociedade constituída para este fim ou já pré-existente. Em ocorrendo a transferência total, a empresa cindida é extinta. Todavia, se a transferência for parcial, a empresa original se mantém, tendo o patrimônio minorado na proporção da cisão.

As obrigações se sucedem na proporção do patrimônio da cindida que fora adquirido em virtude da reestruturação societária.

Conclusão

As modalidades de estruturação e reestruturação societária exploradas no presente artigo são extremamente relevantes no âmbito empresarial, pois garantem que não só a constituição, mas a expansão, transformação, retração e até mesmo liquidação das sociedades se dê em conformidade com a lei, mitigando os riscos e majorando os benefícios das operações.

Como envolvem, em muitos casos, sucessão de direitos e obrigações, é crucial que os empresários interessados em tais práticas sejam bem assessorados por uma equipe com expertise, capaz de esclarecer sobre os riscos e as vantagens envolvidas em cada uma das operações, após minuciosa análise.

Para ser bem sucedido em sua operação de estruturação ou reestruturação societária, consulte um(a) advogado(a) especializado(a) para entender o seu caso e lhe propor as melhores e mais seguras soluções jurídicas.

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Autora

GABRIELA GUSMÃO CANEDO DA SILVA. Advogada (OAB/PR nº. 75.294). Pós-graduada em Direito Contemporâneo pelo Centro de Estudos Jurídicos do Paraná. Graduada em Direito pela Universidade Federal do Paraná.

Referências

[1] Disponível em https://www.gov.br/empresas-e-negocios/pt-br/mapa-de-empresas/boletins/mapa-de-empresas-boletim-1o-quadrimestre-2023.pdf. Acesso em 21 jun. 2023.

[2]https://www.juntacomercial.pr.gov.br/sites/default/arquivos_restritos/files/documento/2023-04/JUCEPAR_Constitui%C3%A7%C3%A3o_20220916_9.pdf

[3] VIDO, Elisabete. Curso de direito empresarial. 4. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2015, p. 279.

[4] VIDO, Elisabete. Curso de direito empresarial. 4. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2015, p. 280.

[5] Idem, p. 281.

[6] Disponível em <https://www.treasy.com.br/blog/fusoes-e-aquisicoes/>. Acesso em 22 jun. 2023.

 

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