Em artigo anterior tratando sobre o tema da holding patrimonial (imobiliária), publicado em junho/2022, explicamos que o termo holding, em inglês, significa “segurando” e deriva do verbo to hold (segurar, manter, reter), referindo-se, no âmbito do direito empresarial, a uma pessoa jurídica criada com o objetivo de centralizar a administração e o controle acionário de outras empresas, gerindo o acervo patrimonial de um determinado grupo econômico.
Os objetivos principais da constituição de uma holding podem ser: melhorar a eficiência na gestão de ativos, promover proteção patrimonial e obter benefícios fiscais. A holding é vista, ainda, como uma excelente ferramenta de planejamento sucessório e vem sendo utilizada não somente por empresas e grupos econômicos, mas, também, por famílias que possuem patrimônio.
No Brasil, a regulamentação jurídica deste tipo societário adveio com a promulgação da Lei nº. 6.404/1976, que trata das Sociedades por Ações, a exemplo do art. 2°, § 3º, que preceitua:
Art. 2º Pode ser objeto da companhia qualquer empresa de fim lucrativo, não contrário à lei, à ordem pública e aos bons costumes.
§ 3º A companhia pode ter por objeto participar de outras sociedades; ainda que não prevista no estatuto, a participação é facultada como meio de realizar o objeto social, ou para beneficiar-se de incentivos fiscais.
Não obstante tal previsão legal, a Sociedade Anônima não é a única modalidade admitida para a constituição de uma holding, como se explicará adiante.
Holding na modalidade “Sociedade Anônima”
Quando constituída na forma de Sociedade Anônima, a holding se submete ao regime jurídico da citada Lei nº. 6.404/1976 e, subsidiariamente, às disposições do Código Civil de 2002, detendo algumas características peculiares.
Inicialmente, trata-se de uma sociedade de capital, em que o capital social é integralizado e divido por ações e não por cotas, podendo ser aberta ou fechada, a depender da possibilidade ou não de negociação de seus títulos no mercado de valores mobiliários.
A responsabilidade dos sócios e acionistas está limitada à integralização do preço de emissão das ações subscritas ou adquiridas, nos termos do art. 1º da Lei nº. 6.404/1976.
A Sociedade Anônima pode, ainda, participar de outras sociedades, seja para consecução de seu objeto social, seja para beneficiar a empresa com incentivos fiscais, conforme prevê o art. 2º, §3º da Lei nº. 6.404/1976, razão pela qual é tão comumente utilizada na constituição das holdings.[1]
Contudo, a doutrina destaca a importância de que, nas holdings, o objeto social seja descrito da forma mais detalhada possível junto ao estatuto social, sob pena de, na ausência de previsão estatutária, a companhia ficar limitada às formas de participação supracitadas: somente para incentivo fiscal ou quando haja permeabilidade entre as atividades de ambas as empresas.[2]
Holding constituída como “Sociedade Limitada”
Ao se instituir uma holding pelo regime jurídico da Sociedade Limitada, o principal regramento legal aplicável será o Código Civil brasileiro, cujas disposições específicas sobre o tema se encontram no artigo 1.052 e seguintes.
A sociedade poderá ser de pessoas ou de capital, em conformidade com seu contrato social, que ficará arquivado na Junta Comercial do ente federativo em que fora registrada.
Nestes casos, via de regra, a sociedade responde de forma ilimitada por toda e qualquer obrigação contraída, enquanto que os sócios respondem de forma limitada e subsidiária pela integralização do capital subscrito, e, de forma solidária, pelo capital não integralizado.
Excepcionalmente, a responsabilidade dos sócios poderá ser ilimitada quando suas deliberações infringirem o contrato ou a lei, na forma do art. 1.080 do Código Civil ou, ainda, se comprovado o abuso da personalidade jurídica, que culmine em desconsideração da personalidade jurídica para atingimento do patrimônio pessoal do sócio, nos termos do art. 50 do Código Civil.[3]
Holding do tipo “SLU – Sociedade Limitada Unipessoal”
Com a recente extinção da figura da “EIRELI – Empresa Individual de Responsabilidade Limitada”, a alternativa para a constituição de uma holding sem a necessidade de sócios se dá por intermédio da Sociedade Limitada Unipessoal, também conhecida pela sigla SLU.
Esta modalidade foi criada pela MP 881/2019, popularmente chamada de “MP da Liberdade Econômica”, posteriormente convertida na Lei nº. 13.874/2019 e está regulamentada no art. 1.052 do Código Civil:
Art. 1.052. Na sociedade limitada, a responsabilidade de cada sócio é restrita ao valor de suas quotas, mas todos respondem solidariamente pela integralização do capital social.
1º A sociedade limitada pode ser constituída por 1 (uma) ou mais pessoas.
2º Se for unipessoal, aplicar-se-ão ao documento de constituição do sócio único, no que couber, as disposições sobre o contrato social.
A grande inovação que torna a SLU mais vantajosa em relação à EIRELI é que não há nela exigência de capital social mínimo, permitindo sua abertura com menor investimento inicial, visando desburocratizar a abertura de empresas no país.
De outro lado, como qualquer outra Sociedade Limitada, a SLU tem por característica a separação entre o patrimônio do empresário e da empresa, de modo que a responsabilidade por obrigações contraídas pela empresa só atingirá a pessoa do sócio nas restritas hipóteses do citado art. 50 do Código Civil de 2002, se houver desconsideração da personalidade jurídica por abuso de personalidade, caracterizado pelo desvio de finalidade ou pela confusão patrimonial.
Conclusão
Independente de qual seja a espécie de constituição societária definida para a holding, em todas as hipóteses podem estar sujeitas à regulamentação pelo CADE (Conselho Administrativo de Defesa Econômica), a fim de evitar a formação de monopólios e garantir a livre concorrência no país. A livre concorrência, não se pode olvidar, é princípio constitucional insculpido no art. 170, IV, da Constituição Federal de 1988.
Por fim, vale destacar que a escolha quanto ao tipo societário da holding envolve questões complexas de planejamento financeiro e tributário, para averiguar qual será o caminho mais vantajoso no caso concreto.
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AUTORA
Gabriela Gusmão Canedo da Silva. Advogada (OAB/PR nº. 75.294). Pós-graduada lato sensu em Direito Contemporâneo Luiz Carlos Centro de Estudos Jurídicos. Graduada em Direito pela Universidade Federal do Paraná.
REFERÊNCIAS
[1] VIDO, Elisabete. Curso de direito empresarial. 4. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2015, p. 229.
[2] FRANCO, Vera Helena de Mello. SZTAJN, Raquel. Direito empresarial II: Sociedade anônima: mercado de valores mobiliários. 3. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2014, p. 88.
[3] VIDO, Elisabete. Op. Cit., p. 203,207-208.
FRANCO, Vera Helena de Mello. SZTAJN, Raquel. Direito empresarial II: Sociedade anônima: mercado de valores mobiliários. 3. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2014.
VIDO, Elisabete. Curso de direito empresarial. 4. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2015.