O legislador ao estabelecer o procedimento comum, que é a regra no ordenamento jurídico brasileiro, reservou um tratamento diferenciado para alguns institutos, que por sua relevância, objetivos, e peculiaridades atinentes ao direito material, merecem um método específico que melhor atenda às necessidades dos envolvidos.
A ação monitória, como veremos, faz parte desse rol especial de procedimentos, ao qual o legislador intencionou trazer maior celeridade para alcançar a formação de um título executivo judicial.
CELERIDADE PROCESSUAL
O princípio da celeridade processual, introduzido pela Emenda Constitucional 45/2004, e abarcado pelo novel Código de Processo Civil, com acerto, assumiu relevante papel na compreensão de que o processo não deve ser um fim em si mesmo, mas sim um instrumento por intermédio do qual as partes se valem com o propósito de conquistar o bem da vida perante o Estado-Juiz.
PREVISÃO LEGAL
O referido tipo de processo está previsto nos artigos 700 a 702 do Código de Processo Civil, mesclando características do procedimento comum e do processo de execução:
Art. 700. A ação monitória pode ser proposta por aquele que afirmar, com base em prova escrita sem eficácia de título executivo, ter direito de exigir do devedor capaz:
I – o pagamento de quantia em dinheiro;
II – a entrega de coisa fungível ou infungível ou de bem móvel ou imóvel;
III – o adimplemento de obrigação de fazer ou de não fazer.
§ 1º A prova escrita pode consistir em prova oral documentada, produzida antecipadamente nos termos do
art. 381 .
§ 2º Na petição inicial, incumbe ao autor explicitar, conforme o caso:
I – a importância devida, instruindo-a com memória de cálculo;
II – o valor atual da coisa reclamada;
III – o conteúdo patrimonial em discussão ou o proveito econômico perseguido.
§ 3º O valor da causa deverá corresponder à importância prevista no § 2º, incisos I a III.
§ 4º Além das hipóteses do
art. 330 , a petição inicial será indeferida quando não atendido o disposto no § 2º deste artigo.
§ 5º Havendo dúvida quanto à idoneidade de prova documental apresentada pelo autor, o juiz intimá-lo-á para, querendo, emendar a petição inicial, adaptando-a ao procedimento comum.
§ 6º É admissível ação monitória em face da Fazenda Pública.
§ 7º Na ação monitória, admite-se citação por qualquer dos meios permitidos para o procedimento comum.
Art. 701. Sendo evidente o direito do autor, o juiz deferirá a expedição de mandado de pagamento, de entrega de coisa ou para execução de obrigação de fazer ou de não fazer, concedendo ao réu prazo de 15 (quinze) dias para o cumprimento e o pagamento de honorários advocatícios de cinco por cento do valor atribuído à causa.
§ 1º O réu será isento do pagamento de custas processuais se cumprir o mandado no prazo.
§ 2º Constituir-se-á de pleno direito o título executivo judicial, independentemente de qualquer formalidade, se não realizado o pagamento e não apresentados os embargos previstos no
art. 702 , observando-se, no que couber, o
Título II do Livro I da Parte Especial .
§ 3º É cabível ação rescisória da decisão prevista no caput
quando ocorrer a hipótese do § 2º.
§ 4º Sendo a ré Fazenda Pública, não apresentados os embargos previstos no
art. 702 , aplicar-se-á o disposto no
art. 496 , observando-se, a seguir, no que couber, o
Título II do Livro I da Parte Especial.
§ 5º Aplica-se à ação monitória, no que couber, o
art. 916 .
Art. 702. Independentemente de prévia segurança do juízo, o réu poderá opor, nos próprios autos, no prazo previsto no
art. 701 , embargos à ação monitória.
§ 1º Os embargos podem se fundar em matéria passível de alegação como defesa no procedimento comum.
§ 2º Quando o réu alegar que o autor pleiteia quantia superior à devida, cumprir-lhe-á declarar de imediato o valor que entende correto, apresentando demonstrativo discriminado e atualizado da dívida.
§ 3º Não apontado o valor correto ou não apresentado o demonstrativo, os embargos serão liminarmente rejeitados, se esse for o seu único fundamento, e, se houver outro fundamento, os embargos serão processados, mas o juiz deixará de examinar a alegação de excesso.
§ 4º A oposição dos embargos suspende a eficácia da decisão referida no caput
do
art. 701 até o julgamento em primeiro grau.
§ 5º O autor será intimado para responder aos embargos no prazo de 15 (quinze) dias.
§ 6º Na ação monitória admite-se a reconvenção, sendo vedado o oferecimento de reconvenção à reconvenção.
§ 7º A critério do juiz, os embargos serão autuados em apartado, se parciais, constituindo-se de pleno direito o título executivo judicial em relação à parcela incontroversa.
§ 8º Rejeitados os embargos, constituir-se-á de pleno direito o título executivo judicial, prosseguindo-se o processo em observância ao disposto no
Título II do Livro I da Parte Especial , no que for cabível.
§ 9º Cabe apelação contra a sentença que acolhe ou rejeita os embargos.
§ 10. O juiz condenará o autor de ação monitória proposta indevidamente e de má-fé ao pagamento, em favor do réu, de multa de até dez por cento sobre o valor da causa.
§ 11. O juiz condenará o réu que de má-fé opuser embargos à ação monitória ao pagamento de multa de até dez por cento sobre o valor atribuído à causa, em favor do autor.
Isto é, a Ação Monitória abrevia o deslinde processual em cognição sumária com caráter condenatório, extirpando uma grande preocupação trazida no acesso à justiça, notadamente no procedimento comum com sua cognição exauriente, a lentidão que compromete, muitas vezes, a prestação jurisdicional.
NATUREZA JURÍDICA
A natureza jurídica da Ação Monitória, conforme destaca Nelson Nery Júnior e Rosa Maria de Andrade Nery[1] “é ação de conhecimento, condenatória, com procedimento especial, de cognição sumária e execução sem título.”
Cumpre destacar, em que pese sua característica de cognição sumária, a cognição plena pode ser instaurada com a manifestação da parte contrária, pois no que tange o mandado citatório, cabe ao Réu cumprir o mandado expedido, opor embargos ou permanecer inerte.
No segundo caso alarga-se o contraditório, onde teremos cognição plena; no último caso, o título executivo judicial constitui-se de pleno direito e prescinde de qualquer formalidade e a ordem de cumprimento da obrigação se torna definitiva.
PROCEDIMENTO COMUM x PROCEDIMENTO MONITÓRIO
Frise-se que a despeito da diferença entre o procedimento comum e o procedimento monitório paira justamente na eventualidade do contraditório, razão porque seu impulso, como dito, é iniciativa do Réu, e quando não instaurado, o Autor da ação tem acesso imediato ao processo de execução, abreviando o caminho para obter o bem da vida.
Assim sendo, a ação monitória é instrumento facilitador que sumariza o percurso até que se alcance uma verdade factual, por isso considerada uma tutela diferenciada, sui generis.
O procedimento monitório, segundo Humberto Theodoro Júnior[2] encontra relevância na função que cumpre de propiciar ao Autor, de forma rápida, o título executivo, e por consequência o acesso mais célere à execução forçada.
Não obstante ser um simplificador processual, para ser possível seu manejo é vital que atenda determinados requisitos, pois tem cabimento somente para aquele que pugna seu direito corporificando-o em prova escrita sem eficácia de título executivo uma obrigação de pagar quantia em dinheiro, entregar coisa fungível ou infungível, sendo bem móvel ou imóvel.
REQUISITOS
Veja-se que, são requisitos específicos para a propositura da ação:
a) Prova documental escrita que contenha obrigação líquida, certa e exigível: A lei não conceitua prova escrita para os fins de ação monitória, mas a doutrina é uníssona em considerar a prova escrita pré-constituída ou até mesmo prova casual, física ou eletrônica, bastando que o magistrado possa autenticar a sua eficácia probante;
b) Documento sem eficácia executiva: Uma questão que se coloca é a diferença entre o título executivo e a prova escrita. O título executivo é aquele definido em lei como tal, conforme mencionados nos arts. 515 e 784, do Código de Processo Civil, lado outro, a prova escrita não está substancializada em um rigor probatório, mas se reveste de aptidão para demonstrar o crédito pleiteado, bem como as partes envolvidas, a obrigação e o objeto, de modo que permitam ao julgador, de plano, formar sua convicção. Documento sem eficácia executiva (prova escrita) é, portanto, todo aquele que não dependa de outro, subsidiariamente, para provar o alegado.
c) A pretensão deve objetivar o recebimento de um pagamento em quantia, entrega de coisa fungível ou infungível ou determinado bem móvel ou imóvel bem como de adimplemento de obrigação de fazer ou de não fazer: Neste ponto “a pretensão é sempre condenatória, jamais declaratória ou constitutiva, já que a esses não segue nenhuma execução.”[3]
A QUEM É OPONÍVEL
Além disso, importante destacar que a ação monitória só é oponível em face de devedor capaz, mas será opoente conta a Fazenda pública. (Súmula 339 do STJ e art. 700, § 6º).
DISCRICIONARIEDADE DE UTILIZAÇÃO
No que concerne a discricionariedade de sua utilização, usualmente há a indagação de que se aquele que detém um título executivo extrajudicial pode optar pelo procedimento monitório.
Via de regra, a ação monitória não é alternativa para quem possui um título com aptidão para execução pela via convencional, no entanto, o art. 785 do Código de Processo Civil dispõe que: “A existência de título executivo extrajudicial não impede a parte de optar pelo procedimento de conhecimento, a fim de obter título executivo judicial”.
Assim, embora o dispositivo não faça menção expressa ao procedimento monitório, sabe-se que esse é bem menos complexo do que o comum, nessa linha, vale a máxima: quem pode o mais, pode o menos. Não há, portanto, falta de interesse de agir em quem demanda pelo procedimento monitório em vez do procedimento usual, desde que atendidas as peculiaridades desse intento.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Em suma, segundo os professores Luiz Rodrigues Wambier e Eduardo Talamini[4], a tutela monitória teve origem para cuidar das situações em que embora a inexistência de título executivo, haja forte aparência de que aquele que se designa credor realmente o seja.
Razão porque o procedimento monitório tem como finalidade precípua a rápida produção de um título executivo acelerando, assim, o cumprimento da obrigação, pois há existência concreta do crédito, notadamente se o réu regularmente citado não opõe defesa.
AUTORES
Antonio Neiva de Macedo Neto. Advogado (OAB/PR sob nº. 55.082) e sócio do Barioni & Macedo Sociedade de Advogados. Pós-graduado em Direito Processual Civil Contemporâneo pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUC/PR).
Gisele Schereder. Advogada (OAB/PR nº. 100.186). Pós-graduada em Direito Constitucional pela ABDConst. Pós-graduanda em Direito Processual Civil pela Escola Superior da Advocia (ESA).
REFERÊNCIAS
[1] NERY JÚNIOR, Nelson; NERY Rosa Maria de Andrade. Comentários ao Código de Processo civil. São Paulo: Revista dos Tribunais. 2015, p. 1518.
[2] THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de Direito Processual Civil: Procedimentos especiais. Rio de Janeiro: Forense. 2018. p. 412.
[3] GONÇALVES, Marcus Vinícius Rios. Direito processual civil esquematizado. 8. Ed. São Paulo: Saraiva, 2017.
[4] WAMBIER, Luiz Rodrigues; TALAMINI, Eduardo. Curso Avançado de Processo Civil: Processo cautelar e procedimentos especiais. 14. Ed. São Paulo: Revista dos Tribunais. 2015.