Leilão Judicial de Imóvel: Entenda Como Funciona

Leilão de imóvel judicial

Comprar – ou arrematar, na semântica jurídica correta – um imóvel em um leilão judicial pode ser uma ótima oportunidade de negócio, por possibilitar ao adquirente a compra do imóvel em valor menor do que o de mercado.

Todavia, se não forem tomados os cuidados necessários para arrematar imóvel de leilão judicial, a compra do bem pode se tornar um verdadeiro pesadelo. Veja abaixo algumas dicas e explicações sobre o tema.

DIFERENÇA ENTRE LEILÃO JUDICIAL E EXTRAJUDICIAL

Já tratamos a arrematação de imóvel em leilão extrajudicial em artigo anterior (clique aqui para ler).Em suma, o leilão extrajudicial é realizado quando não há processo judicial, de modo que o imóvel geralmente está atrelado a uma alienação fiduciária inadimplida, que gera a retomada do bem pela instituição financeira fiduciária e o consequente leilão do mesmo.

O leilão judicial, por sua vez, como o nome já diz, ocorre quando há processo judicial. Ou seja, em caso de execução e/ou cumprimento de sentença, por exemplo, havendo a expropriação de bens da parte executada, com a consequente penhora do imóvel, há a hasta pública do bem, para que o valor do arremate seja revertido em prol do credor.

De outro lado, pode ocorrer leilão judicial por outros motivos como, por exemplo, para divisão do quinhão de cada herdeiro em um processo de inventário.

EXPLICANDO UM POUCO O QUE É A ARREMATAÇÃO DE IMÓVEL EM LEILÃO JUDICIAL

Para melhor entender o que é a arrematação de bem imóvel, comparamos o ato do arremate a uma compra de imóvel qualquer.

Todavia, a doutrina jurídica[1] destaca que, na realidade, a arrematação é um ato de autoridade do Estado, de modo que alguns autores definem a arrematação como ato processual e outros como negócio jurídico bilateral entre Estado e arrematante que contém a alienação com a aceitação da oferta.

Outros autores, ainda, como Theodoro Junior[2], dizem que a arrematação é um ato de expropriação mediante o qual se faz, a que haja dado o lanço vencedor, a transferência coativa dos bens penhorados, com pagamento à vista ou em certas condições.

Araken de Assis[3], por sua vez, assevera que a arrematação não poderia ter caráter negocial, tendo em vista que inexistente a confluência de declarações de vontade.

Ou seja, no caso da arrematação, o juiz apenas verificaria se estariam presentes os pressupostos legais, dando os bens arrematados em favor do maior lance com a deliberação judicial determinando a transferência coativa do bem.

Os autores Celso Neves e Marilda Helena de Mello Sachs[4], de outro lado, entendem que arrematação é um procedimento de jurisdição voluntária para a transferência coativa de bens em favor de terceiros que, intervindo no processo, oferece o melhor preço, procedimento esse inserido no processo de execução, a cujas finalidades serve[5].

De toda forma, a arrematação de imóvel em leilão judicial ocorre no decorrer de um processo judicial que está em fase de execução ou de outra natureza que necessite da hasta pública do imóvel para prosseguir quanto aos credores ou a quem deva receber os proventos decorrentes da arrematação.

REGRAS DO LEILÃO JUDICIAL CONTIDAS NO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL

Diferentemente do leilão extrajudicial, que é procedido em regra conforme as normas da Lei nº. 9.514/97 (Lei de Alienação Fiduciária), no leilão judicial é o Código de Processo Civil a legislação que rege as normas necessárias para validade do ato.

Assim sendo, em um processo judicial, havendo uma execução de título judicial ou extrajudicial, assim como cumprimento de sentença, após o inadimplemento do débito, ocorre a fase de expropriação de bens, seguindo-se a ordem prevista no art. 835 do Código de Processo Civil:
Art. 835. A penhora observará, preferencialmente, a seguinte ordem:

I – dinheiro, em espécie ou em depósito ou aplicação em instituição financeira;

II – títulos da dívida pública da União, dos Estados e do Distrito Federal com cotação em mercado;

III – títulos e valores mobiliários com cotação em mercado;

IV – veículos de via terrestre;

V – bens imóveis;

VI – bens móveis em geral;

VII – semoventes;

VIII – navios e aeronaves;

IX – ações e quotas de sociedades simples e empresárias;

X – percentual do faturamento de empresa devedora;

XI – pedras e metais preciosos;

XII – direitos aquisitivos derivados de promessa de compra e venda e de alienação fiduciária em garantia;

XIII – outros direitos.
De outro lado, conforme já exposto, também pode ocorrer leilão judicial em casos como necessidade de venda para divisão do quinhão de cada herdeiro em um processo de inventário ou, ainda, necessidade de leilão judicial do imóvel para extinção de copropriedade em condomínio, entre duas ou mais pessoas.

Com efeito, no caso de execução, encontrado bem imóvel em nome do devedor no processo judicial, é procedida avaliação do mesmo por Oficial de Justiça e, após, o bem é leiloado. Antes do leilão ser efetivado, todavia, deve ser publicado edital de leilão com antecedência de, no mínimo 05 (cinco) dias antes da data marcada (conforme dispõe o art. 887, § 1º, CPC), contendo obrigatoriamente os seguintes itens previstos no art. 886 do Código de Processo Civil:
Art. 886. O leilão será precedido de publicação de edital, que conterá:

I – a descrição do bem penhorado, com suas características, e, tratando-se de imóvel, sua situação e suas divisas, com remissão à matrícula e aos registros;

II – o valor pelo qual o bem foi avaliado, o preço mínimo pelo qual poderá ser alienado, as condições de pagamento e, se for o caso, a comissão do leiloeiro designado;

III – o lugar onde estiverem os móveis, os veículos e os semoventes e, tratando-se de créditos ou direitos, a identificação dos autos do processo em que foram penhorados;

IV – o sítio, na rede mundial de computadores, e o período em que se realizará o leilão, salvo se este se der de modo presencial, hipótese em que serão indicados o local, o dia e a hora de sua realização;

V – a indicação de local, dia e hora de segundo leilão presencial, para a hipótese de não haver interessado no primeiro;

VI – menção da existência de ônus, recurso ou processo pendente sobre os bens a serem leiloados. Parágrafo único. No caso de títulos da dívida pública e de títulos negociados em bolsa, constará do edital o valor da última cotação.
Dessa maneira, o Código de Processo Civil preceitua em seus arts. 730 e 879 a 903 as normas acerca do leilão judicial, normas estas que devem ser analisadas minuciosamente pelo arrematante e, se possível, por advogado especialista em direito imobiliário para melhor orientá-lo, quando há interesse na arrematação de bem imóvel em hasta pública.

QUEM PODE OFERECER LANCE?

Em um leilão judicial, qualquer indivíduo pode oferecer lance, exceto aqueles previstos no art. 890, CPC, conforme se vê:
Art. 890. Pode oferecer lance quem estiver na livre administração de seus bens, com exceção:

I – dos tutores, dos curadores, dos testamenteiros, dos administradores ou dos liquidantes, quanto aos bens confiados à sua guarda e à sua responsabilidade;

II – dos mandatários, quanto aos bens de cuja administração ou alienação estejam encarregados;

III – do juiz, do membro do Ministério Público e da Defensoria Pública, do escrivão, do chefe de secretaria e dos demais servidores e auxiliares da justiça, em relação aos bens e direitos objeto de alienação na localidade onde servirem ou a que se estender a sua autoridade;

IV – dos servidores públicos em geral, quanto aos bens ou aos direitos da pessoa jurídica a que servirem ou que estejam sob sua administração direta ou indireta;

V – dos leiloeiros e seus prepostos, quanto aos bens de cuja venda estejam encarregados;

VI – dos advogados de qualquer das partes.
Desta feita, as pessoas que não estiverem inseridas nos itens acima podem oferecer lance ao leilão judicial. Até mesmo o executado do processo pode arrematar seu bem. Todavia, neste último caso, caso ele arremate o bem e ainda reste saldo devedor, o imóvel não será liberado em seu favor, bem como o valor do lance será convertido como parte de pagamento do débito[6].

COMO FUNCIONA A ARREMATAÇÃO DE IMÓVEL EM LEILÃO JUDICIAL

Primeiramente, cumpre ressaltar que o leilão judicial de imóvel está previsto nas hipótese de alienação do art. 879 do Código de Processo Civil:
Art. 879. A alienação far-se-á: I – por iniciativa particular; II – em leilão judicial eletrônico ou presencial.
De todo modo, sendo publicado edital do leilão e obedecidas as formalidades supracitadas, o interessado na arrematação do imóvel pode comparecer no leilão para dar seus lances e tentar adquiri-lo. Se for online, basta cadastrar-se na plataforma para poder dar lances online. Importante destacar que o imóvel leiloado não pode ser arrematado por preço vil, segundo art. 891, CPC:
Art. 891. Não será aceito lance que ofereça preço vil. Parágrafo único. Considera-se vil o preço inferior ao mínimo estipulado pelo juiz e constante do edital, e, não tendo sido fixado preço mínimo, considera-se vil o preço inferior a cinquenta por cento do valor da avaliação.
Dessa forma, caso não haja lances na primeira praça, que geralmente inicia com valores relativos a avaliação do bem, o bem será vendido em segunda praça, com redução expressiva em relação ao valor da primeira praça.

Só não é permitido que seja arrematado em valor inferior a 50% (cinquenta por cento) abaixo do valor da avaliação, consoante exposto, sob pena de ser considerado preço vil e o leilão ser anulado.

Vencedor o lance, o pagamento deverá ser realizado de imediato pelo arrematante, salvo pronunciamento judicial em sentido diverso (art. 892, CPC). Caso o arrematante, todavia, queira adquirir o bem mediante pagamento de parcelas, deverá apresentar por escrito proposta que atenda às especificações do art. 895, do Código de Processo Civil:
Art. 895. O interessado em adquirir o bem penhorado em prestações poderá apresentar, por escrito: I – até o início do primeiro leilão, proposta de aquisição do bem por valor não inferior ao da avaliação; II – até o início do segundo leilão, proposta de aquisição do bem por valor que não seja considerado vil.
Com efeito, a proposta deverá conter oferta de pagamento de pelo menos 25% (vinte e cinco por cento) do valor do lance à vista e o restante parcelado em até 30 (trinta) meses, consoante § 1º do dispositivo supraindicado.

Nessa hipótese de pagamento em parcelas, caso haja atraso, incidirá multa de 10% (dez por cento) sobre a soma da parcela inadimplida e vincendas (art. 895, § 4º, CPC), bem como é autorizado ao exequente a resolução da arrematação ou promover execução do valor devido nos próprios autos da arrematação (art. 895, § 5º, CPC).

Assinado o auto de arrematação pelo juiz, pelo arrematante e pelo leiloeiro, a arrematação será considerada perfeita, acabada e irretratável, ainda que venham a ser julgados procedentes os embargos do executado, o, assegurada a possibilidade de reparação pelos prejuízos sofridos, consoante dispõe o art. 903, CPC.

De toda forma, em que pese as regras do leilão judicial estarem disponibilizadas para consulta no Código de Processo Civil, necessário se faz muitas vezes, para resguardar os direitos do arrematante, bem como assessorá-lo quanto aos riscos, a prévia consulta em advogado especialista em direito imobiliário.

Além disso, após a carta de arrematação ser assinada, deve ser averbada a matrícula do imóvel com a referida informação, devendo ser pagas custas ao cartório, além do valor já pago anteriormente ao próprio leiloeiro.

Por fim, caso o imóvel esteja ocupado, necessário se faz o ajuizamento de Ação em Imissão na Posse, para o fim de desocupar o bem, que deverá ser proposta nos próprios autos de execução ou ao processo principal que deu origem à hasta pública.

CONCLUSÃO

Diante do exposto, tendo sido explicado o que é leilão judicial, hipóteses de cabimento e como funciona o arremate de imóvel na referida modalidade, imprescindível se faz o alerta de que consulta à advogado(a) especialista no assunto do direito imobiliário, antes de realizar qualquer negócio/lance/arremate é necessário, para averiguar minuciosamente questões que envolvam possíveis riscos e, assim, sejam prevenidos e mitigados prejuízos decorrentes da arremtação.
DESCOMPLICANDO O DIREITO:
Abaixo, veja a explicação de alguns termos jurídicos para melhor compreensão do texto:
Arrematar = compra em leilão;
Hasta pública = leilão;
Credor = a quem se deve dinheiro ou valor;
Extrajudicial = que não corre perante os órgãos judiciais, fora do Judiciário;
Alienação Fiduciária = financiamento em que é dado um bem em garantia, como, por exemplo, um imóvel;
Fiduciária = instituição financeira que concedeu o financiamento, em troca da garantia “passada” para seu nome;
Ficou alguma dúvida sobre o assunto ou algum termo utilizado? Deixe nos comentários abaixo!
AUTORES
Antonio Neiva de Macedo Neto. Advogado (OAB/PR sob nº. 55.082) e sócio do Barioni & Macedo Sociedade de Advogados. Pós-graduado em Direito Processual Civil Contemporâneo pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUC/PR).

Clarice de Camargo Ibañez. Bacharela em Direito. Mestra em Ciência Política pela Universidade Federal do Paraná (UFPR).

Gisele Barioni de Macedo. Advogada (OAB/PR nº. 57.136) e sócia do Barioni & Macedo Sociedade de Advogados. Pós-graduada em Direito e Processo Tributário pela Academia Brasileira de Direito Constitucional (ABDConst). Pós-graduada em Direito Processual Civil Contemporâneo pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUC/PR).

Referências bibliográficas

[1] PASSOS, Josué Modesto. Arrematação no registro de imóveis: continuidade do registro e natureza da aquisição. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais. 2ª Ed. 2015. P. 99.

[2] THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de direito processual civil. Processo de execução e cumprimento de sentença. Processo cautelar e tutela de urgência. Rio de Janeiro: Editora Forense. 41ª ed. 2007. P. 368 e 383.

[3] ASSIS, Araken de. Manual da Execução. São Paulo: Editora RT. 13ª ed. . P. 815.

[4] NEVES, Celso. Comentários  ao Código de Processo Civil. Rio de Janeiro: Editora Forense. Vol. 7 apud SACHS, Marilda Helena de Mello. Natureza jurídica da arrematação. cit., p. 94, 103 e 108.

[5] PASSOS, Josué Modesto. Arrematação no registro de imóveis: continuidade do registro e natureza da aquisição. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais. 2ª Ed. 2015. P. 101.

[6] Leilão Coletivo. Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios. 2020. Disponível em: <https://www.tjdft.jus.br/informacoes/perguntas-mais-frequentes/leilao-coletivo> Acesso em 23 nov 2021.

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