Trava dos 30% e Planejamento Tributário Abusivo

A trava dos 30% é entendida como constitucional pelos Tribunais Superiores, a fim de evitar o Planejamento Tributário Abusivo.

superior tribunal de justiça 30%

Hoje, a especialista em Direito Tributário, Gisele Barioni de Macedo, contextualizará a recente decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ) sobre a “trava dos 30%“, que é entendida como constitucional pelos Tribunais Superiores, a fim de evitar Planejamento Tributário Abusivo.

Notícia do CONJUR comentada, de 24/11/2021:
STJ reafirma trava contra planejamento tributário abusivo de empresas extintas

O QUE É A TRAVA DOS 30%?

  Sobre a “trava dos 30%“, a Lei 8981/95, em seus artigos 15 e 42, estabelece, em suma, que:
Para prejuízo fiscal apurado a partir do encerramento do ano-calendário de 1995, poderá existir a compensação, de forma cumulativa aos os prejuízos fiscais apurados até 31 de dezembro de 1994, com o lucro líquido ajustado pelas adições e exclusões previstas na legislação do imposto de renda, observado o limite máximo, para a compensação, de trinta por cento do referido lucro líquido ajustado.
Assim, com base na legislação do imposto sobre a renda, acima indicada, as pessoas jurídicas optantes pelo regime de tributação pelo lucro real, podem, em tese, compensar tributos incidentes sobre o lucro com prejuízos fiscais apurados em anos anteriores, abatendo, assim, até o limite de 30% do prejuízo fiscal do ano. 

Com efeito, tendo em vista que prejuízo fiscal pode ser considerado como o resultado negativo decorrente da apuração do lucro real e compensável com lucros reais posteriores (na apuração do IRPJ e da CSLL), as empresas contribuintes poderão deduzir da base de cálculo tributos quando voltar a obter lucro, devendo, apenas ser observado, esse limite de 30% sobre o lucro para fins de compensação.

Essa limitação de 30% gerou discussão porque, segundo aqueles que não concordaram, a “trava dos 30%” violaria os princípios constitucionais como a vedação ao confisco e o princípio da capacidade contributiva. Todavia, em julgamento no STF em 2019, a trava de 30% para compensação foi considerada constitucional (RE nº. 591.340).

PARA A EMPRESA, QUAL A SITUAÇÃO JURÍDICA NO MOMENTO?

NO CARF

A 1ª Turma da Câmara Superior do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (CARF), em agosto/2021[1], entendeu por afastar o limite anual da “trava dos 30%” na compensação de prejuízos, em caso que envolvia extinção da pessoa jurídica por incorporação. 

NAS PRIMEIRAS INSTÂNCIAS

 No Tribunal Regional Federal da 4ª Região, que abarca as regiões do PR, SC e RS, o entendimento recente é de que a “trava dos 30%” é constitucional, com fulcro no julgamento do RE nº. 591.340, pelo STF.

Isso porque, em tal julgamento, conforme exposto, foi reiterado o entendimento de que é constitucional a limitação do direito de compensação de prejuízos fiscais de IRPJ e da base de cálculo negativa da CSLL.

NO STF

No Supremo Tribunal Federal (STF), após o julgamento do RE nº. 591.340, com trânsito em julgado em 06/03/2020 (Repercussão Geral – Tema 117), não houve mais mudança de entendimento, sendo considerado ainda constitucional a “trava dos 30%“.

SE ESSE É O ENTENDIMENTO DO STF, QUAL DISCUSSÃO NO STJ QUE AINDA SUBSISTE?

É sabido que o STF é a última instância decisória no ordenamento jurídico, pelo que, após o julgamento do RE nº. 591.340, não haveria mais que se discutir o tema nas instâncias inferiores.

Ocorre que a decisão do STF suspostamente não teria tratado do assunto relativo à hipótese de extinção da pessoa jurídica em caso de incorporação, sendo a tese recursal da empresa, neste caso, de que a” trava dos 30%” não se aplicaria em casos de extinção da PJ pois, caso contrário, a empresa incorporada perderia o direito da compensação ou se limitaria também. 

Após outros jugados no STJ, com o mesmo entendimento, em decisão de 23 de novembro de 2021, a 2ª Turma do Tribunal Superior do Trabalho (TST), com base nas premissas do artigos 33 do Decreto-Lei nº. 2.341/1987, que proíbe que os prejuízos fiscais de uma empresa incorporada sejam aproveitados pela empresa incorporadora, bem como legislação já citada acima, manteve a aplicabilidade da “trava dos 30%” ressaltando que: “a fusão ou incorporação geram confusão patrimonial entre a empresa extinta e a sucessora”.

Nesse sentido, veja-se trecho da decisão[2] do REsp 1.925.025, no Superior Tribunal de Justiça (STJ):
Acaso se permita à empresa extinta compensar em si mesma prejuízos fiscais para além dos limites legais de 30% antes de ser fusionada ou incorporada, na prática ela estará levando para a nova empresa sucessora via confusão patrimonial um percentual de compensação de prejuízos fiscais que poderá ser superior aos próprios 30% que a nova empresa sucessora poderia compensar quando aplicado o limite em si mesma.
Com isso, não importa, para a aplicação da norma, que a compensação ocorra antes ou depois da confusão patrimonial entre extinta e sucessora.

Resumindo: a empresa incorporada, mesmo antes de tal situação jurídica, só pode aproveitar 30% para o abatimento, de forma que o restante não poderá ser abatido nem por ela e nem pela incorporadora, futuramente.

Sucedida: abatimento apenas até 30%;
Sucessora: não pode nenhum abatimento em relação àquela;

Comentário: Observando a principiologia e finalidade da legislação, caso empresas pudessem abater 100% do prejuízo fiscal se tornariam um “produto” mercadologicamente muito visado para outras empresas (incorporadoras), o que resultaria em planejamento tributário abusivo.  

COMO ANALISAR MELHORES ESTRATÉGIAS PARA O ABATIMENTO DE PREJUÍZO FISCAL?  

É fundamental a análise individual para a verificação mais viável da reorganização tributária da empresa, analisando-se de forma ampla e completa: enquadramento tributário e a melhor forma de abatimento dos prejuízos fiscais, inclusive, verificando estratégias paralelas.

Com efeito, alguns programas, estabelecidos pelo governo, muitas vezes colocam o beneficio de abatimentos maiores, com a finalidade da manutenção da economia, por exemplo.  


AUTORA
Gisele Barioni de Macedo. Advogada (OAB/PR nº. 57.136) e sócia do Barioni & Macedo Sociedade de Advogados. Pós-graduada em Direito e Processo Tributário pela Academia Brasileira de Direito Constitucional (ABDConst). Pós-graduada em Direito Processual Civil Contemporâneo pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUC/PR).


REFERÊNCIAS

[1] Entendimento da 1ª Turma da Câmara Superior de Recursos Fiscais do CARF, em acórdão proferido no processo administrativo nº 19515.007944/2008-00

[2] Decisão no REsp 1.925.025 no Superior Tribunal de Justiça (STJ).

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