TJSP Mantém Nulidade da Execução Extrajudicial e da Consolidação da Propriedade



Na notícia comentada de hoje, a Dra. Gisele Schereder contextualizará o fato de que, devido à falta de constituição em mora da devedora, a 33ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo declarou nulo o procedimento de execução extrajudicial de contrato imobiliário adotado por um banco e, consequentemente, também foi declarada nula a consolidação da propriedade em seu nome.

O CASO

A 33ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo entendeu pela nulidade do procedimento de execução extrajudicial de um contrato imobiliário adotado pelo Banco Santander, o que acarretou na nulidade da consolidação da propriedade em nome da mencionada instituição.

Em síntese, a requerente alegou que estava em mora com o adimplemento de algumas prestações e foi surpreendida ao saber que seu imóvel estava sendo leiloado.

Em sua defesa, nos autos do processo de nº. 1073864-87.2019.8.26.000, o advogado da requerente alegou nulidade no procedimento adotado pelo banco, pois sua cliente jamais foi notificada quanto ao seu inadimplemento, tampouco que seu imóvel iria a leilão.

Tal entendimento foi acolhido pelo juízo de primeiro grau, pois, de fato, não houve a constituição em mora da devedora para que fosse possível, em tese, o êxito do banco em seu intento.

O QUE O BANCO ARGUIU

No caso em comento, o banco arguiu a ocorrência da consolidação da propriedade em seu favor, em consonância com os termos e cláusulas contratuais.

Irresignado com a sentença de primeiro grau, contrária ao seu pedido, recorreu ao Tribunal de Justiça de São Paulo, cujos julgadores mantiveram o entendimento do Juízo a quo, por conceberem que não foi comprovado pela instituição financeira a constituição em mora da devedora, nos termos da lei que dispõe sobre o Sistema de Financiamento Imobiliário – Lei 9.514/97 – notadamente o artigo 26, §§1º e 3º.

No Superior Tribunal de Justiça, o agravo em recurso especial interposto pela instituição financeira, também restou inexitoso, uma vez que, sem o banco impugnar os fundamentos da decisão atacada, o Egrégio Tribunal não admitiu o recurso.

INTIMAÇÃO DO DEVEDOR

Veja-se que, para os fins do artigo de lei acima mencionado, o devedor deverá ser intimado, a requerimento do credor, pelo oficial do competente Registro de Imóveis, para satisfazer, no prazo de quinze dias, a prestação vencida e as que se vencerem até a data do pagamento, bem como no que concerne às demais penalidades e encargos contratuais.

Além disso, a intimação do devedor deveria ter ocorrido pessoalmente, o que no caso telado, nunca ocorreu.

COMENTÁRIO DA ESPECIALISTA

Nesse sentir, coerente a decisão adotada pelos respeitáveis julgadores, tendo em vista que a finalidade da interpelação premonitória é conferir ao devedor a oportunidade de exercer a purgação da mora, salvaguardando o contrato avençado entre as partes, sendo, assim, um pressuposto processual na hipótese de propositura de ação judicial pelo credor.

Desse modo, mesmo se tratando de obrigação líquida e com prazo determinado, imprescindível que o credor proceda com a prévia notificação extrajudicial do devedor para constituí-lo em mora.

Observe-se que, em consonância com o critério de hermenêutica adotado da especialidade, quando exigir norma jurídica especial em que – nada obstante a obrigação seja positiva, líquida e a termo – exija a prévia efetivação da notificação do devedor, a peça inicial ajuizada pelo credor, deverá necessariamente vir instruída com a comprovação da notificação, sob pena de extinção por ausência de pressuposto processual.[1]

A sistemática da constituição do devedor em mora prevista no Código Civil não tem o condão de revogar normas jurídicas especiais, eis que estas guardam relação de especialidade frente àquelas.[2]

Ficou com alguma dúvida? Fale conosco: entre em contato.

Clique aqui e leia mais artigos escritos por nossa equipe.

AUTORA

Gisele Schereder. Advogada (OAB/PR nº. 100.186). Pós-graduada em Direito Constitucional pela AbdConst (Academia Brasileira de Direito Constitucional). Pós-graduada em Processo Civil pela ESA (Escola Superior da Advocacia – OAB Nacional).

REFERÊNCIAS

[1] REsp 1951467, rel. Min. Marco Aurélio Bellizze

[2] REsp 19.110, rel. Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira

Compartilhar

Outras postagens

embargos de declaração

Embargos de declaração e sua amplitude do efeito interruptivo para pagamento espontâneo ou impugnação

O recurso de  embargos de declaração é uma ferramenta essencial no processo civil brasileiro, destinada a esclarecer pontos omissos, contraditórios ou obscuros de uma decisão judicial.

No entanto, a extensão dos efeitos desse recurso, especialmente quanto ao seu efeito interruptivo, é um tema que suscita debates entre os operadores do direito.

Este artigo explora o papel dos embargos de declaração, com ênfase na sua capacidade de interromper prazos processuais exclusivamente para a interposição de recursos, sem se estender a outros meios de defesa, como a impugnação ao cumprimento de sentença, ou ao cumprimento espontâneo da obrigação de pagamento.

tokenização

Tokenização e o Mercado Imobiliário

Tokenização, uma prática inovadora e em ascensão no campo tecnológico, tem sido cada vez mais reconhecida por suas promessas de revolucionar diversos setores, com destaque especial para o mercado imobiliário. Nesse cenário, o presente artigo se propõe a aprofundar e elucidar os diversos aspectos que envolvem a tokenização. Além de definir e contextualizar o conceito em questão, serão destacadas suas aplicações práticas e os impactos que vem gerando no mercado imobiliário. Ao mesmo tempo, serão minuciosamente examinadas as vantagens e desafios inerentes a essa inovação disruptiva.
Os debates no Brasil tomam destaque a partir de provimento publicado pela corregedoria do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJRS) sobre o registro de tokens representativos de propriedade imobiliária nos cartórios de registro de imóveis daquela região. A controvérsia, abordada no provimento do Tribunal, surgiu quando diversos cartórios no Rio Grande do Sul receberam solicitações para lavrar e registrar (…)

valuation

Liquidação de Quotas Sociais de Sociedades Empresárias: Critérios para a Adequada e Justa Valoração da Empresa (“valuation”).

Este artigo abordará os aspectos jurídicos, práticos e de “valuation” para a liquidação de quotas sociais em sociedades empresárias no Brasil, com base, principalmente, na jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (STJ) e nos critérios práticos recomendados para a valoração das empresas.

A liquidação de quotas sociais em sociedades empresárias é um processo complexo que envolve aspectos jurídicos, contábeis, financeiros, operacionais, entre outros critérios técnicos para o devido “valuation”.
Este artigo buscará aprofundar o entendimento sobre o tema, considerando, sobretudo, os parâmetros básicos a partir da jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (STJ) e os métodos específicos de levantamento do valor real de mercado das empresas.

reequilíbrio contratual

Contratos de Apoio à Produção da Caixa Econômica Federal e o Direito ao Reequilíbrio

A legislação, como se percebe, oferece algumas saídas em caso de eventos imprevisíveis que afetem as condições contratuais. Por um lado, é possível a resolução do contrato por onerosidade excessiva, mas se pode pleitear a modificação equitativa das cláusulas contratuais. O mercado imobiliário, após dois anos de severas dificuldades, dá sinais de que pode retomar seu crescimento. Por outro lado, a insegurança jurídica decorrente de situações que se alastram desde a pandemia é um repelente de potenciais clientes e investidores. A legislação brasileira oferece mecanismos suficientes para rever contratos firmados anteriormente e que tenham sido afetados pela alta dos insumos da construção civil. Por isso, a elaboração de uma estratégia jurídica sólida é fundamental para a manutenção dos investimentos e continuidade de empreendimentos.

Enviar mensagem
Precisa de ajuda?
Barioni e Macedo Advogados
Seja bem-vindo(a)!
Como podemos auxiliá-lo(a)?