SFH e Atraso na Obra: O Que Fazer?

Entenda um pouco mais do que é o SFH (Sistema Financeiro de Habitação) e quais as possíveis consequências jurídicas para atraso em obra ou entrega de imóvel adquirido por esta modalidade de financiamento, junto à Caixa Econômica Federal (CEF).

O QUE É SFH

O SFH (Sistema Financeiro da Habitação) foi criado pela Lei nº. 4.380/64 para permitir o prolongamento do prazo de quitação das parcelas de financiamento de imóvel, e, portanto, viabilizar a aquisição da casa própria, com maior facilidade.

OBJETIVO

O SFH possui como objetivo, conforme dispõe art. 8º da Lei nº. 4.380/64, a facilitação e a promoção de construção/aquisição de casa própria ou moradia para a população brasileira, especialmente para as classes de menor renda da sociedade.

CARACTERÍSTICAS

Como características, o Sistema Financeiro de Habitação (SFH) prevê a regulamentação das condições de financiamento imobiliário, relativas, por exemplo, à taxa de juros, à quota e aos prazos de pagamento.

O financiamento, dessa forma, possui limitações impostas pela lei, como, por exemplo, não poder ser superior a 80% do valor da propriedade (incluindo-se, neste percentual, as despesas acessórias), consoante disposto no art. 6º da Resolução nº. 4.676/2018 do Banco Central.

Outrossim, conforme art. 13 da Resolução nº. 4.676/2018, as operações no âmbito do SFH devem observar como condições que o custo efetivo máximo para o mutuário, compreendendo juros, comissões e outros encargos financeiros, não podendo exceder 12% a.a. (doze por cento ao ano); bem como a atualização do saldo devedor, caso prevista em contrato, deve ser realizada pela remuneração básica aplicável aos depósitos de poupança.

Além das entidades previstas no art. 8º da Lei nº 4.380, de 1964[1], também são componentes do referido sistema as demais instituições financeiras autorizadas a funcionar pelo Banco Central do Brasil e as entidades fechadas de previdência complementar.

REQUISITOS

Conforme determinação do Conselho Monetário Nacional, podem ser adquiridos por meio do financiamento no SFH os imóveis com valor de avaliação de até R$ 1.500.000,00 (um milhão e quinhentos mil reais).

Cumpre destacar que o imóvel a ser financiado deve ser residencial, urbano, devidamente registrado no Cartório de Registro de Imóveis e não pode ter sido objeto de outro financiamento pelo FGTS nos últimos três anos.

O proponente, por sua vez, deve ser brasileiro nato ou naturalizado, ou se estrangeiro, deve possuir visto permanente no país. Não pode possuir, também, cadastro nos órgãos de proteção ao crédito, como por exemplo, SPC, Serasa, Bacen e Receita Federal.

Além disso, deve possuir capacidade econômico-financeira para arcar com as parcelas do financiamento e capacidade civil (maior de 18 anos ou maior de 16 anos emancipado).

IMÓVEL FINANCIADO PELO SFH E COM ATRASO NA OBRA

“MINHA CASA, MINHA VIDA”

Consoante entendimento do Superior Tribunal de Justiça, foram fixadas teses (Tema 966) quando há atraso na obra e entrega de imóveis financiados e adquiridos pelo Programa ‘Minha Casa, Minha Vida’.

Por se tratar de julgamento de Recurso Especial Repetitivo[2], há efeito vinculante nos demais casos similares. Veja-se, in verbis, as referidas teses:

1) Na aquisição de unidades autônomas em construção, o contrato deverá estabelecer, de forma clara, expressa e inteligível, o prazo certo para a entrega do imóvel, o qual não poderá estar vinculado à concessão do financiamento, ou a nenhum outro negócio jurídico, exceto o acréscimo do prazo de tolerância.
2) No caso de descumprimento do prazo para a entrega do imóvel, incluído o período de tolerância, o prejuízo do comprador é presumido, consistente na injusta privação do uso do bem, a ensejar o pagamento de indenização, na forma de aluguel mensal, com base no valor locatício de imóvel assemelhado, com termo final na data da disponibilização da posse direta ao adquirente da unidade autônoma.
3) É ilícito cobrar do adquirente juros de obra, ou outro encargo equivalente, após o prazo ajustado no contrato para a entrega das chaves da unidade autônoma, incluído o período de tolerância.
4) O descumprimento do prazo de entrega do imóvel, computado o período de tolerância, faz cessar a incidência de correção monetária sobre o saldo devedor com base em indexador setorial, que reflete o custo da construção civil, o qual deverá ser substituído pelo IPCA, salvo quando este último for mais gravoso ao consumidor.    

Ou seja, se descumprido o prazo para entrega do imóvel, havendo atraso na obra ou na entrega do imóvel além do que previsto em contrato, é presumido o prejuízo do comprador. Tal presunção cessa a correção monetária sobre o saldo devedor e gera o dever da construtora ao pagamento de indenização mensal, na forma de aluguel, em valor de mercado aplicado à imóveis semelhantes, diante da injusta privação do bem.

De outro lado, caso o comprador opte por assim fazer, pode ser requerida a resolução do contrato, com a devolução das parcelas pagas e demais considerações aplicáveis ao caso concreto.

IMÓVEL ADQUIRIDO POR MEIO DO SFH

Em situação de atraso de obra e entrega de imóvel comprado por meio de financiamento no Sistema Financeiro de Habitação (SFH), que é vinculado à Caixa Econômica Federal, o Tribunal Regional da 4ª Região já possui jurisprudência assente de que a responsabilidade entre a CEF e a Construtora é solidária[3].

Ou seja, em caso de condenação à indenização por danos materiais, moral, ou demais decisões do Juízo favoráveis ao comprador, a CEF responderia em conjunto com a Construtora, sendo obrigada a reparar eventuais danos da mesma maneira, podendo o credor cobrar o total da dívida de ambos ou apenas daquele que possuir maior probabilidade de quitá-la.

Dessa maneira, a depender do caso concreto, após análise do profissional competente (advogado) e sua equipe, é possível pleitear danos morais – pedido este inclusive que vem sido acolhido pelas turmas do Tribunal Regional da 4ª Região, com fulcro no art. 944 do Código Civil – e demais responsabilizações da Construtora e da CEF pelos danos causados a(o) comprador(a) do imóvel.


AUTORES

Antonio Neiva de Macedo Neto. Advogado (OAB/PR sob nº. 55.082) e sócio do Barioni & Macedo Sociedade de Advogados. Pós-graduado em Direito Processual Civil Contemporâneo pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUC/PR).

Clarice de Camargo Ibañez. Bacharela em Direito. Mestra em Ciência Política pela Universidade Federal do Paraná (UFPR).

Gisele Barioni de Macedo. Advogada (OAB/PR nº. 57.136) e sócia do Barioni & Macedo Sociedade de Advogados. Pós-graduada em Direito e Processo Tributário pela Academia Brasileira de Direito Constitucional (ABDConst). Pós-graduada em Direito Processual Civil Contemporâneo pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUC/PR).


[1] I – pelos bancos múltiplos;

II – pelos bancos comerciais;

III – pelas caixas econômicas;

IV – pelas sociedades de crédito imobiliário;

V – pelas associações de poupança e empréstimo;

VI – pelas companhias hipotecárias;

VII – pelos órgãos federais, estaduais e municipais, inclusive sociedades de economia mista em que haja participação majoritária do poder público, que operem, de acordo com o disposto nesta Lei, no financiamento de habitações e obras conexas;

VIII – pelas fundações, cooperativas e outras formas associativas para construção ou aquisição da casa própria sem finalidade de lucro, que se constituirão de acordo com as diretrizes desta Lei;

IX – pelas caixas militares;

X – pelas entidades abertas de previdência complementar;

XI – pelas companhias securitizadoras de crédito imobiliário;

XII – por outras instituições que venham a ser consideradas pelo Conselho Monetário Nacional como integrantes do Sistema Financeiro da Habitação.

[2] REsp nº 1729593 / SP (2018/0057203-9) autuado em 14/03/2018

[3] TRF4, AC 5002076-75.2020.4.04.7205, QUARTA TURMA, Relator ANA RAQUEL PINTO DE LIMA, juntado aos autos em 15/07/2021; TRF4, AC 5059555-84.2019.4.04.7100, QUARTA TURMA, Relator ANA RAQUEL PINTO DE LIMA, juntado aos autos em 15/07/2021; TRF4, AC 5009523-22.2017.4.04.7205, TERCEIRA TURMA, Relatora MARGA INGE BARTH TESSLER, juntado aos autos em 30/06/2021; TRF4, AC 5002204-39.2018.4.04.7214, TERCEIRA TURMA, Relatora MARGA INGE BARTH TESSLER, juntado aos autos em 30/06/2021;

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