Retomada da Indústria Brasileira Pós-Pandemia

retomada da indústria

O mundo foi marcado por um momento conturbado e de imensos desafios nos últimos anos, de forma totalmente inesperada. A chegada de uma pandemia globalizada, acompanhada de mudanças climáticas, ataques cibernéticos, guerras e conflitos geopolíticos fez com que a indústria e toda a cadeia envolvida na área produtiva fossem duramente afetadas, sendo necessário repensar no modo de tratar os novos desafios que vieram acompanhados deste cenário.

Pensando nisso, foi possível observar a implementação de planos de apoio à inovação, pesquisa, tecnologia e fortalecimento das indústrias por parte do governo. Ao ler o artigo a seguir, será possível entender as medidas e decisões adotadas pela Indústria durante e após a crise gerada pela pandemia da Covid-19, bem como as ações do governo brasileiro em apoio à retomada da indústria neste cenário.

Os Desafios da Retomada

A indústria é um dos principais propulsores da economia brasileira. Prova disso é que o setor representou mais de 20% do Produto Interno Bruto (PIB) e mais de 30% da arrecadação de Tributos Federais[1] já no ano de 2022, onde ainda estava instalado um cenário de insegurança, vestígio da crise sanitária gerada pela pandemia da Covid-19, a qual ainda não havia estabilizado totalmente.

Aliás, o Brasil foi um dos países mais afetados e, durante o período de crise, de acordo com o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), mais de 70% das indústrias apresentaram um impacto geral negativo, sendo que 40% das empresas paralisadas totalmente durante a pandemia tiveram que fechar suas portas[2].

No geral, para a retomada após este cenário, já com alguma estabilização, alguns dos desafios da indústria brasileira foram e continuam sendo: o investimento em serviços personalizados e com maior qualidade; a diminuição orçamentária; a redução de gastos através da adoção do home office ou do trabalho híbrido; a digitalização ou armazenamento digital de arquivos, procedimentos e sistemas. A tentativa, no momento, é de retomar a economia do Brasil ao patamar pré-pandemia.

Os setores mais afetados foram os classificados “não essenciais”, tais como: esportes, shows e eventos, aviação, turismo e hotelaria. Em contrapartida, empresas que já trabalhavam com tecnologia para vender seus serviços ou produtos conseguiram ter menos impactos em seus negócios, além de realocar com mais facilidade no contexto do pós-pandemia.

Cenário da Indústria Pré e Pós-Pandemia

No contexto pré-pandemia, setores como o farmacêutico, automobilístico, eletroeletrônico, energético, têxtil e agroindustrial ganhavam destaques na produção do país[3].

Para o cenário atual, o desafio da Indústria é aplicar mudanças estruturais e comportamentais visando reequilíbrio financeiro e reposição no mercado, além de medidas que contribuam com a modernização dos processos de produção e a redução de custos de produção.

Uma vertente que vêm chamando a atenção dos investidores da Indústria e que tem tido uma avaliação positiva no auxílio à recuperação das empresas é a utilização do avanço tecnológico, incorporando a Indústria 4.0 aos seus negócios.

Indústria 4.0

Também conhecida como “Quarta Revolução Industrial”, este é um movimento global que abrange um amplo sistema de tecnologias avançadas, utilizando o que há de mais moderno na produção de bens de consumo, tais como: a inteligência artificial, robótica, big data[1], internet das coisas, machine learning[2] e computação em nuvem, que vêm modificando tanto as formas de produção como os modelos de negócios em todo o mundo.

O termo “Indústria 4.0” surgiu na Alemanha, com o objetivo de designar uma nova forma de produção industrial, a qual é baseada na integração de tecnologias digitais e à rápida digitalização na manufatura nos dias atuais.

Não se trata de uma única tecnologia em si, nem um modelo de negócio específico, mas sim uma abordagem que busca resultados industriais que não eram possíveis há poucos anos atrás.

Trata-se, portanto, da combinação de inovações e tecnologias digitais capazes de alavancar a produção industrial, permitindo que máquinas e robôs executem tarefas, bem como desenvolvam e analisem dados estatísticos com precisão.

Dentre os principais – e imediatos – impactos da sua implementação estão: redução de custos de manutenção e equipamentos, redução do consumo de energia, aumento da eficiência do trabalho.

O Papel do Estado – Legislação e Políticas Fiscais Durante a Crise

Tendo em vista o cenário de recuperação e fomento do mercado e do setor Industrial, é de suma importância a implementação de políticas públicas que visem seu avanço e desenvolvimento de modo seguro e eficiente, reduzindo os danos advindos da crise.

As medidas adotadas pelo governo federal brasileiro durante a crise decorreram, principalmente, da declaração de “estado de calamidade pública” e da aprovação do “orçamento de guerra” no ano de 2020. Neste cenário, o orçamento federal não precisou cumprir algumas regras fiscais vigentes, como o teto de gastos, por exemplo. As medidas anunciadas pelo governo brasileiro até o fim de 2020 contabilizavam um montante equivalente a 11% do PIB[7].

Ainda, o Benefício Emergencial de Preservação do Emprego e da Renda (BEm) representou cerca de 6,4% do total de gastos da União com a Covid-19 em 2020, com cerca de R$ 33,5 bilhões, segundo o Tesouro Nacional. Com ele, o empregador pôde, por meio de acordos individuais ou coletivos, suspender contratos de trabalho em andamento por até sessenta dias ou reduzir a jornada de trabalho e salário por até noventa dias. No caso dos contratos suspensos, os trabalhadores de empresas com renda bruta inferior a R$ 4,8 milhões receberam da União o equivalente ao total do seguro-desemprego. Caso a renda bruta da empresa fosse superior a este montante, a empresa deveria arcar com 30% do salário em contrato e a União com o equivalente a 70% do seguro-desemprego. Por fim, para os casos de redução das jornadas de trabalho, o programa previa reduções de 25%, 50% e 70% tanto das jornadas quanto dos salários.

Em termos de renúncia fiscal, destaca-se a redução do Imposto sobre Operações Financeiras (I.O.F.) incidente sobre operações de crédito, o que teve um impacto da ordem de R$ 19,1 bilhões.

Outra medida importante adotada pelo governo federal foi a aprovação da Lei Complementar nº. 186/2021[8], que alterou a Lei Complementar nº 160/2017, para o fim de:

(…) permitir a prorrogação, por até 15 (quinze) anos, das isenções, dos incentivos e dos benefícios fiscais ou financeiro-fiscais vinculados ao Imposto sobre Operações Relativas à Circulação de Mercadorias e sobre Prestações de Serviços de Transporte Interestadual e Intermunicipal e de Comunicação (ICMS).

Desta forma, a lei prorroga até o ano de 2032 incentivos fiscais concedidos pelos estados e pelo Distrito Federal para empresas. A Lei contempla o setor industrial, bem como de comércios atacadistas, empresas que desenvolvem atividades portuárias e aeroportuárias e operações interestaduais com produtos agropecuários. A lei trata da concessão unilateral de isenções e benefícios fiscais do ICMS, por parte de Estados, que buscam atrair investimentos para seus territórios e, consequentemente, maior produtividade e lucratividade.

CNI e o Plano de Retomada da Indústria

Pensando no cenário de recuperação que o país ainda enfrenta, a CNI (Confederação Nacional da Indústria)[6], elaborou em maio de 2023 uma Proposta que abrange medidas que visam o aperfeiçoamento e modernização de marcos regulatórios eficientes, de modo a buscar maior segurança jurídica para os novos investimentos que serão e estão sendo feitos no país. Seu objetivo é ampliar a competitividade das empresas, ao passo em que cria condições ao desenvolvimento sustentável. A Proposta abrange os seguintes tópicos:

  • Acelerar o processo de acessão do Brasil à OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico);
  • Modernizar o licenciamento ambiental;
  • Aprovar o código de defesa dos contribuintes e atualizar o código tributário nacional;
  • Aprovar a lei recuperação judicial e extrajudicial das micro e pequenas empresas (marco legal do empreendedorismo);
  • Estabelecer processo de dupla visita orientadora para fiscalizações relativas a não conformidades de baixo risco;
  • Elaborar plataforma online para registro de todos os regulamentos federais vigentes por produto ou atividade econômica;

Conclusão

A crise mundial ocasionada pela pandemia da Covid-19, junto de outros fatores, culminou em uma crise industrial como há muito não se via. Os obstáculos para o mercado foram muitos e, por muito tempo, não houve uma previsão de volta e reaquecimento do mercado.

Hoje vivemos em um cenário diferente, de retomada, onde a indústria busca os patamares pré-pandemia para se estabelecer e se desenvolver.

Com a implementação de tecnologias no setor, em conjunto com políticas públicas que visam a reestruturação do mercado, foi possível enxergar uma nova forma de estruturar os negócios.

No entanto, é preciso cautela, uma vez que a crise econômica deve se estender por mais tempo, agora de forma mais branda e, como vimos no tópico anterior, ainda faltam políticas públicas no processo de retomada da atividade econômica que amparem as necessidades do mercado industrial.

“A tecnologia move o mundo.” – Steve Jobs.

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Autora

GABRIELA VIEIRA SERRANO, Advogada (OAB/PR sob o nº 116.711) graduada em Direito pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUCPR).

Referências

[1] A importância da Indústria para o Brasil. Disponível em: <https://www.portaldaindustria.com.br/estatisticas/importancia-da-industria/#:~:text=Em%202022%2C%20a%20Ind%C3%BAstria%20respondeu,empresarial%20em%20pesquisa%20e%20desenvolvimento.> Acesso em 12 de agosto de 2023.

[2] Pandemia foi responsável pelo fechamento de 4 em cada 10 empresas com atividades encerradas. Disponível em: <https://agenciadenoticias.ibge.gov.br/agencia-noticias/2012-agencia-de-noticias/noticias/28295-pandemia-foi-responsavel-pelo-fechamento-de-4-em-cada-10-empresas-com-atividades-encerradas> Acesso em 12 de agosto de 2023.

[3] Big Data: O que é, conceito e definição. Disponível em:<https://cetax.com.br/big-data/> Acesso em 14 de agosto de 2023.

[4] O que é machine learning? Disponível em: <https://www.ibm.com/br-pt/topics/machine-learning> Acesso em 14 de agosto de 2023.

[5] Plano de Retomada da Indústria. Disponível em: < https://static.poder360.com.br/2023/05/plano_de_retomada_9mai23_web.pdf> Acesso em 15 de agosto de 2023

[6] Fiscal monitor database of country fiscal measures in response to the COVID-19 pandemic. IMF, July 2021b. Disponível em: < https://www.imf.org/en/Topics/imf-and-covid19/Fiscal-Policies-Database-in-Response-to-COVID-19> Acesso em: 16 de agosto de 2023.

[7] Monitoramento dos Gastos da União com Combate à COVID-19. Disponível em: < https://www.tesourotransparente.gov.br/visualizacao/painel-de-monitoramentos-dos-gastos-com-covid-19 >. Acesso em: 17 de agosto de 2023.

[8] Lei Complementar nº 186, de 27 de outubro de 2021. Disponível em: <https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/lcp/lcp186.htm> Acesso em: 17 de agosto de 2023.

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