Liberdade de Pensamento e o Exercício da Advocacia

liberdade de pensamento

Hoje, 14 de julho, comemora-se, mundialmente, a Liberdade de Pensamento, tema deste artigo.

Liberdade de Pensamento

Seres humanos, seres pensantes!

Essa capacidade proporciona a vontade natural, empírica, quase que incontrolável, de se conhecer, desbravar e compreender o espaço em que se vive.

Em busca de respostas, das coisas mais simples às mais complexas, o indivíduo catalisa no pensamento formas e caminhos de encontrá-las.

Seus meios social e cultural auxiliam na construção de definições ou predefinições que farão com que mesmos questionamentos tenham diversas interpretações por seres humanos distintos.

Eis aí o brilhantismo de se compreender o impacto da liberdade de pensamento.

Dia 14 de julho: Dia Mundial da Liberdade de Pensamento

No dia 14 de julho comemora-se, mundialmente, a Liberdade de Pensamento, data esta escolhida em homenagem a queda da Bastilha, marco exordial da Revolução Francesa.

Ainda, consagra e celebra um dos principais princípios norteadores da Declaração Universal dos Direitos Humanos (artigos 18 e 19): o da liberdade de pensamento.

Art. 18. Toda pessoa tem direito à liberdade de pensamento, consciência e religião; este direito inclui a liberdade de mudar de religião ou crença e a liberdade de manifestar essa religião ou crença, pelo ensino, pela prática, pelo culto e pela observância, isolada ou coletivamente, em público ou em particular.

Art. 19. Todo homem tem direito à liberdade de opinião e expressão; este direito inclui a liberdade de, sem interferências, ter opiniões e de procurar, receber e transmitir informações e ideias por quaisquer meios e independentemente de fronteiras.

A construção de valores, dentro da universalidade de direitos garantidos ao indivíduo, inclusive o da liberdade de pensamento, são corolários invioláveis para limitação da ingerência estatal na esfera da autonomia do indivíduo.

A Constituição Federal Brasileira eleva a principio fundamental do Estado Democrático de Direito a liberdade de pensamento (art. 5º, IV, V, VI ), dando igual “peso” ao direito de resposta (réplica):

É livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato.

É assegurado o direito de resposta, proporcional ao agravo, além da indenização por dano material, moral ou à imagem.

No mesmo sentido, a Carta Magna prevê a liberdade de pensamento religioso: “é inviolável a liberdade de consciência e de crença, sendo assegurado o livre exercício dos cultos religiosos e garantida, na forma da lei, a proteção aos locais de culto e a suas liturgias”; e demais searas de liberdade de pensamento, in verbis: “é livre a expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente de censura ou licença”.

Diante disso, questiona-se: O que significa ser livre para pensar? Há limites para a liberdade de pensamento ou de expressão de pensamento?

Segundo o Wikipedia, a Liberdade de pensamento, que tem como sinônimos liberdade de consciência, liberdade de opinião ou liberdade de ideia, é a liberdade que os indivíduos têm de manter e defender sua posição sobre um fato, um ponto de vista ou uma ideia, independente das visões dos outros.

Porém, ao mesmo tempo, esclarece-se que tal liberdade é diferente e não deve ser confundida com liberdade de expressão.

Diante do conceito acima, ainda se permeia a dúvida: sou livre para pensar o que quiser (pensamento não exteriorizado), porém não sou livre para expressá-lo (pensamento exteriorizado)?

Crê-se que a liberdade de pensamento elevada a princípio fundamental universal da convivência humana e preconizada no Brasil como princípio fundamental e inviolável seja a liberdade de exteriorizar o pensamento, ou seja, o direito de expressar, por qualquer meio ou forma existente: opiniões, pensamentos ou ideias particulares em qualquer esfera da atividade humana, seja ela artística, política, científica ou religiosa.

Assim, diante dos artigos já citados, em intepretação literal, nota-se que a liberdade de pensamento ou liberdade de manifestação do pensamento é um direito fundamental e pleno, sendo derivativo deste o direito de resposta e a garantia do não anonimato, para ambos.

Mas, ao mesmo tempo, indaga-se: Qual a finalidade precípua da liberdade de pensamento? Qual seria a forma sábia de utilizá-la, no exercício da cidadania? A aplicação literal de um direito absoluto estaria em sinergia com os demais direitos fundamentais conferidos ao indivíduo?

Em análise aos demais direitos fundamentais e a necessidade de sua coexistência e respeito mutuo, é prudente que liberdade de expressão não seja utilizada de maneira absoluta e indiscriminada, pois os atos de convivência social devem respeitar princípios que visam à manutenção da ordem pública, dos direitos individuais fundamentais e valores consagrados explícitos ou implícitos em nossa Constituição Federal.

Portanto, expressões ofensivas à imagem, à honra e demais direitos que compõem a dignidade da pessoa humana, fundamento da República Federativa do Brasil, ultrapassariam o direito legítimo de expressão, resultando, assim, legalmente, em medidas cíveis e penais para sua contenção, como é o caso, por exemplo, de manifestações racistas.

Frise-se, a liberdade do pensar/opinar é fundamento essencial para o fomento de debates construtivos e democráticos, evolução social, cultural e avanços científicos e esse deve ser o objetivo ao se expressar o pensamento.

Adentrando a especificidade: Há liberdade de pensamento/expressão absoluta no exercício da advocacia?

O artigo 133, da Constituição federal estabelece: O advogado é indispensável à administração da justiça, sendo inviolável por seus atos e manifestações no exercício da profissão, nos limites da lei.

Portanto, primeiramente, cabe frisar que o advogado tem papel fundamental na administração da justiça, então, todos os seus atos, inclusive suas manifestações, devem primar, sempre, pela justiça.

Ainda, note-se: as manifestações, no exercício da profissão – ou seja, não expressões de cunho pessoal, ou político -, são consideradas invioláveis; mas não absolutas, pois devem respeitar os limites legais.

O advogado tem o direito ao acautelamento do uso da palavra, do direito de defesa e do contraditório.

Preconiza, também, o art. 7°, § 2° do Estatuto da OAB que:

“O advogado tem imunidade profissional, não constituindo injúria, difamação ou desacato puníveis qualquer manifestação de sua parte, no exercício de sua atividade, em juízo ou fora dele, sem prejuízo das sanções disciplinares perante a OAB, pelos excessos que cometer“.

Assim, não é licito ao advogado manifestar-se, no exercício de sua profissão, de forma desrespeitosa, sem urbanidade, decoro, honradez e dignidade a quem se dirige, na atuação endoprocessual ou extraprocessual, transpondo valores éticos, sociais e morais.

A responsabilidade na utilização da liberdade de pensamento e expressão deve ser absoluta, pois seu papel na condução e alcance da justiça é indispensável.

Há consenso jurisprudencial e doutrinário que a liberdade de pensamento/manifestação no exercício da advocacia não é ilimitada e irrestrita, podendo, responder por eventuais excessos/abusos.

Sobre a imunidade/liberdade de pensamento, Marçal Justen Filho brilhantemente pontua:

É preciso levar o princípio da imunidade profissional a sério, sob pena de se permitir que um “posicionamento subjetivo contrário à heteronomia do Direito, em que o operador assume o poder de escolher quando aplicar e quando não aplicar o princípio.

Assim, dentro das suas atividades e sua forma de se manifestar, não pode o profissional ficar alheio ao subjetivismo do Poder Judiciário de mensurar se o tipo de palavra ou expressão utilizada ultrapassa simplesmente o direito de expressão, assim sendo, critérios aleatórios de uma régua para cada magistrado do que seria abuso do direito de se manifestar, elevando isso a quase uma censura à forma de se expressar na rotina da advocacia.

Usurpação e garantia de manifestação livre

O direito de expressar-se do advogado não pode ser banalmente tolhido, pois o poder/direito de defesa se encontra assentado do poder/direito de expressão. Seria esvaziar completamente o direito à imunidade no exercício da função.

Assim, os excessos devem ser considerados a exceção e não regra, visando a segurança jurídica e constitucional de defender a justiça desses profissionais.

Atuar com abuso de direito precisa realmente ter definições mais precisas e de ofensa grave, manifestamente detectável e visível o excesso, não apenas de um “não gostei da forma que ele escreveu ou falou”.

Expressões fortes ou firmes não podem ser consideradas invariavelmente como palavras de desacato ou abusivas, sob pena de se esvaziar completamente o direito do advogado de atuação e defesa de direitos.

Assim em um conflito, dentro da subjetividade, de verificação de excesso no uso da palavra, o principio da imunidade deve ser elevado à primeira honra, ou seja, deve ser analisado como princípio norteador, pois inviolável é!

Não se pode permitir que o uso justo e ético da palavra/manifestação, porém de forma mais dura, acalorada, seja considerado como abuso ou excesso.

Não se pode permitir o cerceamento do direito de manifestação do advogado, em sua atividade laborativa, por interpretações extensivas de uso de linguagem, padrões aleatórios ou discricionários.

Não é suficiente exceder.

O excesso tem que ser manifesto, explícito.

Não se pode violar o exercício do direito de advogar.

Não se pode criar grades ou presilhas a atuação da advocacia, sob pena de se enterrar a democracia e a justiça.

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AUTORA

Gisele Barioni de Macedo. Advogada (OAB/PR nº. 57.136) e sócia do Barioni & Macedo Sociedade de Advogados. Pós-graduada em Direito e Processo Tributário pela Academia Brasileira de Direito Constitucional (ABDConst). Pós-graduada em Direito Processual Civil Contemporâneo pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUC/PR).

REFERÊNCIAS

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