Em artigo anterior já tratamos sobre a criação de startups, mas no momento de tração e escala de uma startup muitas vezes não há orçamento suficiente para manter colaboradores essenciais, de forma que o contrato de vesting acaba sendo uma ótima opção. Veja a seguir o que é o contrato de vesting e como funciona.
O que é contrato de vesting?
O termo vesting em português significa “aquisição”. A lógica do contrato de vesting é, portanto, uma aquisição gradual da empresa por parte de um colaborador.
Ou seja, nesse tipo de contrato, o colaborador da empresa convidado pode ir “vestindo” o direito de aquisição de determinado percentual societário, de forma progressiva, conforme, geralmente, o cumprimento de metas pré-definidas e de um período de tempo determinado.
Ou seja, o instrumento serve para alinhar os interesses da sociedade com os de seus colaboradores-chave, a fim de mantê-los engajados no crescimento da companhia.
Com efeito, no Brasil, o contrato de vesting vem sendo utilizado principalmente para a retenção e atração de talentos, bem como para a captação de investimentos no início do desenvolvimento da sociedade.
A partir dele, é entabulado acordo para que o colaborador, mediante seu trabalho por um período de tempo, tenha a oportunidade de adquirir percentuais de capital da companhia com condições específicas, geralmente bem abaixo do preço de mercado.
Em outras palavras, quando uma empresa está em sua fase inicial de desenvolvimento e eventualmente não possui orçamento para atrair ou manter um profissional habilidades e condições de entrega de resultados, pode ser ofertado ao colaborador, além de sua remuneração, a oportunidade de participar no capital da própria empresa.
Nesse caso, o colaborador, a partir de um certo período de tempo e trabalho, se tornaria sócio da companhia.
Por conseguinte, o contrato define as condições e objetivos que o empregado precisa alcançar para poder acionar essa cláusula de aquisição (ou vesting), com uma espécie de cronograma para tanto.
Para que serve o contrato de vesting?
Conforme explicitado acima, o contrato de vesting é um contrato de colaboração que serve para garantir a participação ativa de um colaborador em um empreendimento ou companhia mediante aquisição de direitos sobre o negócio.
Portanto, é positivo tanto para o colaborador, que possui a oportunidade de ser sócio da empresa, como também para os donos da companhia, que poderão usufruir do empenho e labor do colaborador no período.
O colaborador, por sua vez, para adquirir o direito de aquisição (vesting) terá de cumprir metas e trabalhar durante um período específico de tempo na função, muitas vezes sem auferir o salário justo para a categoria, por conta do benefício do vesting.
Ao final, dessa forma, todos saem ganhando, caso a empresa cresça como previsto, tendo em vista que os donos contarão com o esforço do colaborador e o colaborador, ao final, terá a recompensa de parcela da sociedade, sendo destinatário de parte do lucro da companhia.
Da onde surgiu o contrato de vesting?
O vesting surgiu nos Estados Unidos como uma alternativa de alinhar os interesses dos donos das companhias com seus colaboradores mais importantes (altos executivos).
Isso porque o contrato de vesting, como dito, consiste em oferecer um direito de aquisição da empresa a esses funcionários, tornando-se ao final sócios, mesmo que minoritários.
Como funciona o contrato de vesting?
A transferência de direitos societários não ocorre de forma imediata no contrato de vesting.
Para adquirir a parcela na sociedade da companhia, o colaborador deve aguardar o prazo estipulado, que pode ser no período que as partes acharem mais conveniente (4 anos, por exemplo). Esse período é chamado de período de vesting.
Caso seja ofertado que o colaborador possua, ao final do contrato, 10% (dez por cento) da companhia, por exemplo: pode ser especificado que, no período de 04 anos, a cada 01 ano ele poderá adquirir 2,5% (dois e meio por cento) da participação societária.
Portanto, para operacionalizar o contrato de vesting, geralmente é utilizado um contrato de opção de compra de participação societária, a fim de regular o direito à compra de ações ou quotas quando ocorre um determinado evento.
Com efeito, é necessário refletir sobre os objetivos pretendidos com o contrato de vesting, de modo a preencher eventuais posições na empresa por profissionais capacitados em impactar de forma positiva o negócio, assim como trazer resultados.
Diante disso, é necessário que os donos do negócio desenhem posições que poderiam ser preenchidas por profissionais a serem atraídos por esse tipo de programa.
Outrossim, se torna imprescindível definir a quantidade de capital social que será disponibilizado para o contrato de vesting, a fim de evitar a pulverização excessiva do capital social.
Desse modo, observadas estes preceitos, os sócios também devem refletir período de Cliff, definição que será explanada mais adiante.
Este contrato, por sua vez, deve abordar prazos claros, específicos, bem como demais cláusulas e condições importantes para resguardar as partes. O ideal é contratar um profissional capacitado e especializado em contratos de sociedades empresariais, a fim de garantir a solidez e robustez do documento.
Qual sua aplicabilidade na realidade das startups?
O mecanismo do contrato de vesting é utilizado principalmente em startups, visto que são empresas em fase de crescimento e que, portanto, necessitam de meios adequados que as auxiliem a expandir.
Utilizado com mais frequência por startups, os contratos de vesting são capazes de permitir que o(s) colaboradore(s) contratantes possam auxiliar ativamente na criação de produtos ou serviços e fazer o negócio crescer, tendo em vista que adquirirão direitos sobre os lucros da sociedade.
Além disso, nas startups os contratos de vesting podem ser solução para possibilitar que investimentos feito por terceiros de forma intelectual (know how) ou até mesmo financeira.
Isso permite que seja feito o estímulo da expansão e do desenvolvimento empresarial, possibilitando que se tenha maior êxito na consecução dos objetivos sociais da empresa.
Importante salientar que as startups utilizam esse tipo de contrato porque geralmente operam em regime de minimização de custos (“bootstrapping”), de forma que o contrato de vesting se torna uma ótima alternativa.
Quais as vantagens do contrato de vesting?
Além das características já citadas, o contrato de vesting fornece mais segurança ao sócio/empregador na distribuição da participação nos dividendos ou ações de sua startup, bem como proporciona aos colaboradores/funcionários uma oportunidade de aumentar seus ganhos mediante contribuição para o crescimento do negócio, motivando-os a conquistar patamares mais elevados de excelência não só em sua função específica, mas também da empresa em si.
É uma boa opção, portanto, para atração de talentos, bem como é um mecanismos utilizado para resolver o chamado “conflito de agência”. O “conflito de agência” é um conflito de interesses de acionistas/sócios com os de seus gestores, que eventualmente podem estar com objetivos desafinados, resultando um “custo de agência”.
Neste cenário, o contrato de vesting serviria para alinhar os interesses dos sócios quotistas e colaboradores de alto desempenho, otimizando os resultados da companhia.
O que um contrato de vesting deve conter?
Cláusula de Cliff
O Cliff é utilizado geralmente antes do contrato de vesting ou como uma primeira etapa, pois fixa um determina um período mínimo de tempo para que os sócios colaboradores recebam a sua primeira participação societária.
Ou seja, se o colaborador não ultrapassar tal período para passar a ter o direito de aquisição progressivo, conforme combinado, estará abrindo mão do seu direito em adquirir a sua parte combinada no plano de vesting.
Em resumo, a cláusula de Cliff prevê um período mínimo em que o colaborador precisa manter o dever contratual com a empresa sem que receba de forma efetiva o direito de aquisição das quotas sociais da empresa.
Prazo
O contrato de vesting deve conter um prazo específico, que pode ocorrer de forma gradual. Ou seja, se o prazo for de 05 (cinco) anos, o colaborador deve permanecer na sociedade durante o período determinado para que possa adquirir o direito total de aquisição do percentual de quotas sociais previsto em contrato.
Milestones (metas)
Não apenas o colaborador adquirirá o direito de comprar quotas sociais da empresa por um preço geralmente abaixo do mercado, mas ele deve apresentar uma contrapartida para tanto.
Ou seja, o colaborador deve seguir metas (milestones) e atingi-las o que, só então, implicará na sua participação societária. Caso contrário, os direitos de aquisição (vesting) não poderão ser concedidos.
Por exemplo, num contrato de vesting de 04 (quatro) anos, nos quais ao final de cada ano há o direito de o colaborador obter 1/4 das quotas de 10% (dez por cento) ao total, se batidas as metas: se o contrato prevê que ao atingir a meta de crescer o faturamento X da startup ao final do 1º ano, ao colaborador será garantido o direito de comprar os 1/4 dos 10% (dez por cento) a que teria direito.
Com isso, quando a primeira meta for atingida, o parceiro ganhará o direito à 25% (1/4) das ações ou quotas do pacote. Quando a segunda meta é atingida, ele recebe o direito a mais 25% (1/4), totalizando 1/2 (50%) e assim por diante.
As metas (milestones) garantem que o colaborador não se acomode, pois, caso não as atinja, não obterá a vantagem do contrato (oportunidade de aquisição de quotas sociais).
Cumpre destacar que cada realidade variará as cláusulas do contrato, nada impedindo que a ativação do vesting seja feita pelo pelo simples decurso do prazo de permanência do vínculo entre as partes.
Cláusulas de good leaver e bad leaver
A “cláusula de good leaver” ou a “cláusula de bad leaver” preveem a hipótese de abandono precoce do acordo.
Enquanto a “cláusula de good leaver” prestigia aqueles que saem após o cumprimento das regras e condições definidas, a “cláusula de bad leaver” é destinada àqueles que deixariam o acordo antes do que estava disposto contratualmente.
Dessa forma, a “cláusula de good leaver” prevê que os donos do negócio (demais sócios) devem, ao desligamento do colaborador, pagar a sua participação, caso ele tenha adquirido suas cotas sociais regularmente, em valor praticado pelo mercado. O desligamento de um ‘good leaver’ pode ocorrer, por sua vez, em casos de doença, lesão ou falecimento, bem como incapacidade ou aposentadoria, hipóteses que devem estar elencadas no contrato de vesting.
O “bad leaver”, por sua vez, caracteriza-se quando no contrato são previstas certas atitudes do colaborador que ensejarão seu desligamento por conta de, por exemplo, agir de forma consciente para prejudicar a reputação ou sustentabilidade da empresa, não cumprir prazos e deveres, fraude, entre outras. Ao ser desligado, o “bad leaver” receberá sua parte avaliada por valor contábil e receberá somente o que pagou pela participação, independentemente do crescimento da companhia no período.
Preço das quotas sociais
O contrato de vesting pode prever desde o início o preço pelo qual o adquirente (colaborador) pagará pelas quotas sociais ou pode já deixar estabelecida uma fórmula para que se encontre o valor a ser pago periodicamente.
Cláusula de recompra
Caso o colaborador finalize o contrato de vesting, mas os demais sócios não queiram manter vinculados a ele, a cláusula de recompra garante a venda das quotas sociais tanto por tanto, a fim de efetivar-se certo controle do quadro societário da empresa.
Requisitos do contrato de vesting
Por se tratar de um contrato geralmente aplicado às startups (sociedades limitadas), o contrato de vesting segue as regras do Código Civil, assim como os demais contratos. Deve, portanto, ser realizado por agentes capazes, deve ter objeto lícito e determinado ou determinável e deve ser estabelecido em forma própria, no caso, instrumento particular apto a regular obrigações recíprocas:
Art. 121. Considera-se condição a cláusula que, derivando exclusivamente da vontade das partes, subordina o efeito do negócio jurídico a evento futuro e incerto.
Art. 122. São lícitas, em geral, todas as condições não contrárias à lei, à ordem pública ou aos bons costumes; entre as condições defesas se incluem as que privarem de todo efeito o negócio jurídico, ou o sujeitarem ao puro arbítrio de uma das partes.
Caso seja aplicado à Sociedades Anônimas, por sua vez, deverá observar também as normativas da Lei nº. 6.404/76 (Lei de S.A.).
Como é calculado o valor do contrato de vesting?
Para calcular o contrato de vesting, necessário avaliar o valor de mercado do colaborador para compensar eventual diferença, bem como o que o sócio investidor pode oferecer para a empresa, de acordo com os parâmetros de mercado e também com o estágio em que se encontra a empresa.
Qual a diferença de contrato de vesting e stock options?
Os stock options são uma espécie de salário alternativo, fornecido por algumas empresas, mas são aplicadas somente em sociedades anônimas.
Como dito, geralmente as startups não são de capital aberto e sim sociedades limitadas, porque ainda em fase inicial, Dessa forma, as stock options (espécie de compensação) não poderiam ser utilizadas.
Todavia, nada impede que as empresas idealizadas sob a forma de Sociedade Anônima utilizem contratos de vesting, uma vez que não existe nenhuma vedação legal para tanto.
Além disso, no stock options, há o recebimento de dividendos, semelhante aos pagos aos acionistas da empresa, enquanto no vesting a participação ocorre condicionada aos resultados obtidos pelo(a) colaborador(a).
Quais os custos do Contrato de Vesting?
O contrato de vesting pode diversos resultar em incidência de tributos, tendo em vista que a concessão de direitos de aquisição de parcelas do capital social e as opções de compra de ações, ou quotas, possuem características que se refletem na tributação. Desse modo, o correto planjamento do acordo e sua concretização são essenciais.
Ademais, caso a entrega do capital social não se der com critérios mercadológicos, poderá ser considerada remuneração e, como tal, sofrerá a incidência de encargos trabalhistas, como férias, 13º salário, FGTS, além de tributos como INSS. Além disso, a aquisição de quotas sociais interferirá, por certo, no Imposto de Renda da pessoa física do colaborador.
Ainda, se o contrato de vesting prever um pagamento de prêmio inicial ou tão somente ao final do período estipulado, imprescindível verificar se deve haver período em que o adquirente permaneça com as quotas sociais (lock up), assim como estabelecer critérios para venda de sua posição e de sua parcela do capital social.
Conclusão
Conforme elucidado acima, o contrato de vesting geralmente é operacionalizado em startups, sendo um meio de opção de aquisição de participação societária por parte do colaborador, mediante ações pré-determinadas (prazos ou milestones).
Trata-se de uma opção qual qual os interesses dos donos do negócio e colaborador contratado se alinham, podendo contribuir, assim, para o crescimento exponencial do negócio.
Por fim, cumpre destacar que é importante definir um prazo para que essa opção de compra de ações ou quotas seja exercida após cumpridas as condições para seu exercício, além de outras cláusulas específicas desse tipo de contrato essenciais para garantir segurança às partes.
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AUTORES
Antonio Neiva de Macedo Neto. Advogado (OAB/PR sob nº. 55.082) e sócio do Barioni & Macedo Sociedade de Advogados. Pós-graduado em Direito Processual Civil Contemporâneo pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUC/PR).
Clarice de Camargo Ibañez. Advogada (OAB/PR sob o nº. 110.008). Mestra em Ciência Política pela Universidade Federal do Paraná (UFPR).
Gisele Barioni de Macedo. Advogada (OAB/PR nº. 57.136) e sócia do Barioni & Macedo Sociedade de Advogados. Pós-graduada em Direito e Processo Tributário pela Academia Brasileira de Direito Constitucional (ABDConst). Pós-graduada em Direito Processual Civil Contemporâneo pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUC/PR).