Na notícia comentada de hoje, a advogada Gabriela Gusmão Canedo da Silva contextualizará a decisão proferida em primeira instância pela 4ª Vara Cível do Foro Regional III de Jabaquara, Estado de São Paulo, que reconheceu a obrigação legal do condomínio de destinar uma vaga com acessibilidade à moradora com mobilidade reduzida, além de indenizá-la por danos morais.
O DIREITO À VAGA DE GARAGEM COM ACESSIBILIDADE PARA PESSOAS COM DEFICIÊNCIA
A Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência (Lei nº. 13.146/2015) prevê que é dever do Estado, da sociedade e da família assegurar os direitos fundamentais da Pessoa com Deficiência, inclusive o direito à acessibilidade[1].
A acessibilidade, como explica o art. 53 da citada lei, “é direito que garante à pessoa com deficiência ou com mobilidade reduzida viver de forma independente e exercer seus direitos de cidadania e de participação social.”.
Em âmbito municipal, o “Código de Obras e Edificações” é o documento que traz a previsão legal acerca da destinação de vagas de garagens a Pessoas com Deficiência ou com mobilidade reduzida, em edifícios residenciais e não-residenciais.
No caso do Município de São José dos Pinhais, local da sede do escritório Barioni & Macedo Sociedade de Advogados, a Lei Complementar nº. 105/2016 (“Código de Obras e Edificações do Município de São José dos Pinhais”) estabelece em seus artigos 146 e 185:
Art. 146. No cálculo do número mínimo de vagas de estacionamento deverão ser reservadas vagas para pessoas com deficiência ou mobilidade reduzida, localizadas próximo às entradas dos edifícios, destinados aos usos comerciais e de serviços públicos e privados, com largura mínima de 3,50m (três metros e cinquenta centímetros) e comprimento de 5,00m (cinco metros) na proporção de 2% (dois por cento) do total de vagas.
Art. 185. Nos casos de edificações de uso particular destinados à habitação coletiva, com mais de 15 unidades residenciais, será assegurado que, do total de unidades habitacionais do empreendimento, no mínimo 3% (três por cento) seja(m) adaptável(is) ao uso por pessoas com deficiência ou mobilidade reduzida, devendo ser observados, pelo menos, as especificações dos itens 4.2, 4.3, 4.4, 4.6 e 6.9 da NBR 9050 – ou norma técnica oficial que a substitua[2].
O QUE OCORREU NO CASO EM ANÁLISE
No caso sob análise, a autora da ação possui mobilidade reduzida e adquiriu um veículo adaptado para seu uso. Contudo, a vaga de garagem de seu apartamento estaria inserida entre outras duas vagas, impossibilitando-a de se aproximar do automóvel quando em uso da cadeira de rodas, devido à falta de espaços laterais.
Houve tentativa de resolução da questão pela via extrajudicial, no início de 2020, entretanto, após mais de seis meses sem obter uma solução definitiva e satisfatória por parte do condomínio, a autora ingressou com a demanda judicial.
Em sentença, foi reconhecida a obrigação de fazer do condomínio, consistente na destinação de uma vaga apta ao uso por PcD, de forma exclusiva à autora, cumulada com o dever de pagar o valor de R$ 3.000,00 (três mil reais) a título de dano moral, em virtude da “quebra da expectativa da autora em adquirir sua independência, mediante ampla acessibilidade ao uso de vaga adequada”[3].
COMENTÁRIO DA ESPECIALISTA
A acessibilidade nos espaços públicos e privados é um direito garantido a todas as Pessoas com Deficiência. Além de estar previsto na legislação ordinária, é reflexo do princípio constitucional da dignidade da pessoa humana (art. 1º, III, da Constituição Federal de 1988).
Assim, é imprescindível àqueles que atuam no ramo da construção civil, bem como administradores e síndicos de condomínio, contar com profissionais capacitados e comprometidos com a implementação das normas técnicas voltadas às Pessoas com Deficiência.
Não obstante, cabe a toda a sociedade, juntamente com o poder público, fazer valer a aplicação da lei, visando garantir que os espaços das cidades se tornem cada vez mais democráticos e acessíveis a todos e todas, possibilitando o efetivo exercício dos direitos e liberdades individuais, da cidadania e da participação social.
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Gabriela Gusmão Canedo da Silva. Advogada (OAB/PR nº. 75.294). Pós-graduada lato sensu em Direito Contemporâneo Luiz Carlos Centro de Estudos Jurídicos.REFERÊNCIAS
[1] Art. 8º É dever do Estado, da sociedade e da família assegurar à pessoa com deficiência, com prioridade, a efetivação dos direitos referentes à vida, à saúde, à sexualidade, à paternidade e à maternidade, à alimentação, à habitação, à educação, à profissionalização, ao trabalho, à previdência social, à habilitação e à reabilitação, ao transporte, à acessibilidade, à cultura, ao desporto, ao turismo, ao lazer, à informação, à comunicação, aos avanços científicos e tecnológicos, à dignidade, ao respeito, à liberdade, à convivência familiar e comunitária, entre outros decorrentes da Constituição Federal, da Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência e seu Protocolo Facultativo e das leis e de outras normas que garantam seu bem-estar pessoal, social e econômico.
[2] http://acessibilidade.unb.br/images/PDF/NORMA_NBR-9050.pdf
[3] Autos nº. 1020529-19.2020.8.26.0003 – e-SAJ TJ-SP.